Por Em Tempo Notícias (Foto: Marco Antônio/Secom Maceió)
Denunciar as tragédias sociais, eternizá-las na história com imagens, testemunhos, registrar a omissão do poder público usando como ferramentas uma filmadora e máquina fotográfica. Essa é a rotina do cineasta argentino quase brasileiro, Carlos Pronzato, radicado no Brasil e morador da cidade de Salvador na Bahia, desde o final dos anos 80, depois de andar por dez anos pela América Latina conhecendo gente, vivenciando o drama social da população em cada país. E ele garante que visitou todos os países latinos durante essa espécie de vida nômade e conheceu de perto as aflições do povo da América Latina.
É com essa bagagem e esse espírito libertário, como ele próprio diz, que Carlos Pronzato esteve em Maceió e durante alguns dias acompanhou de perto o drama dos moradores e empreendedores dos cinco bairros afetados por afundamento em consequência da mineração predadora de salgema pela Braskem. Um processo que estava ativo há 40 anos e deixa danos físicos, morais, emocionais e financeiros permanentes para 67 mil moradores, 4.500 empreendedores, 30 mil trabalhadores demitidos e 15 mil residências destruídas levando junto memórias, o passado e o futuro de todos os afetados.
Tudo que ele viu e ouviu foi transformado num documentário de 1 hora e 20 minutos; cujo título é “A Braskem passou por aqui: a catástrofe de Maceió”; com depoimentos, drama, sofrimento, omissão dos poderes constituídos, a sensação de impunidade das vítimas e o futuro incerto em relação as indenizações da Braskem, que segue ditando as regras em termos de valores, prazos, retirada de proprietários das casas e quase nenhum diálogo com os atingidos. Uma tragédia sem precedentes no mundo e que merece total atenção também da imprensa brasileira, ressalta o cineasta, mas tem passado despercebida.
O longa metragem será pré-lançado em São Paulo no dia 22 deste mês, às 19 horas no espaço Corp Tower, na rua Bela Cintra, 1.200, próximo a avenida Paulista, e será uma oportunidade para que o Brasil inteiro veja o que a exploração mineral predatória e sem a correta fiscalização dos órgãos públicos ambientais fez com uma das cidades cujo potencial turístico é um dos principais do nordeste. O lançamento em Alagoas deverá ser também nesse mês de julho, cenário da tragédia.
Carlos Pronzato é especialista no assunto e revela que gosta de circular nos espaços universitários, sindicais, entre os movimentos sociais. Ele já fez cerca de 80 documentários com os mais diversos temas como o MST – Movimento dos Sem Terra, Marighela, a vida do Padre Julio Lancelotti, a dívida pública brasileira, a luta pelo direito a água na Bolívia, as greves históricas no Brasil e na Argentina. Também documentou a ocupação de escolas paulistas pelos estudantes, a greve dos professores do Rio Grande do Sul, o assassinato de Mestre Moa na Bahia, num Brasil dividido politicamente.
Entre esses documentários, três feitos no Brasil chamam a atenção pela semelhança. São tragédias ambientais e sociais cuja responsabilidade é a ação do homem e abordam o rompimento da barragem da Vale do Rio Doce em Brumadinho, interior de Minas Gerais; o apagão no Amapá e o afundamento dos bairros de Maceió, Alagoas. Em todos, a negligência de empresas e governos e a lentidão da justiça. Uma espécie de trilogia da tragédia que tem como tema central a destruição de famílias, cidades, bairros e a indiferença dos envolvidos.
Vítimas da tragédia testemunham para o documentário
Carlos Pronzato destaca que fazer esses documentários não é “a nossa prioridade é preservar memórias, garantir o acesso e o registro a essas histórias, dar voz a injustiçados, a movimentos sociais”. O pré lançamento em São Paulo é uma forma de dar visibilidade nacional à tragédia em Alagoas que, ao contrário de Brumadinho e o Amapá, continua acontecendo, o solo continua afundando e ninguém sabe quando vai parar, e se terá mais pessoas atingidas.
A saga do cineasta argentino quase brasileiro, que também é diretor teatral, poeta e escritor, lhe rendeu vários prêmios nacionais e internacionais como o do Conselho Latino-Americano de Ciência Sociais – CLACSO em 2008 e o prêmio italiano Roberto Rosselini em 2009. No Brasil foi agraciado com prêmio Liberdade de Imprensa da Tribuna Livre no Rio de Janeiro, em 2019; melhor filme no Festival de Caraguases em Minas Gerais em 2020 e o prêmio Diretos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil do Rio Grande do Sul.