Aloísio Morais
Um raro flagrante de gordofobia foi julgado e condenado pela Justiça do Trabalho de Muriaé, na Zona da Mata de Minas. D. L., de 26 anos, vendedora de uma loja de bijuterias passou quase um ano e meio esperando para receber um adicional de seu salário por cumprimento de meta: a redução de peso imposta por um chefe sócio do estabelecimento. Resultado, a 1ª Vara do Trabalho da cidade condenou a loja a pagar a indenização de R$ 50 mil por danos morais à agora ex-funcionária.
A sua advogada, Grazielle Berizonzi, informou que, para receber uma complementação salarial de R$ 200, a comerciária era obrigada a cumprir metas de emagrecimento fixadas pelo patrão, como a perda de cinco quilos por mês.
“Para atingir as tais metas, ela ficava sem comer e até vomitava algumas refeições. A proximidade da data de pagamento passou a gerar pânico, virou uma tortura. Durante o período em que trabalhou na loja, D. chegou a emagrecer, mas não foi um emagrecimento saudável. O custo à saúde mental foi muito grande”, contou Grazielle.
De acordo com a advogada, os métodos exigidos para comprovação da perda de peso da trabalhadora eram tão rigorosos quanto humilhantes. Fotos anexados ao processo bilhetes deixados pelo chefe em que determina: “Favor apresentar pesagem do dia 5/6/2019 com carimbo da academia, certificando que o peso foi realizado no dia”. Em outro recado, escrito no envelope usado para acondicionar o complemento, o patrão avisou: “Caso não tenha perdido o peso (combinado) do mês de julho, favor devolver os R$ 200″.
Também foi anexado ao processo um áudio gravado pela comerciária (Ouça abaixo) registrando um dos momentos em que foi constrangida a medir seu peso numa balança comprada pelo patrão. Antes de subir no aparelho, a vendedora diz: “Eu me pesei sexta-feira. Deixa eu te mostrar a foto (da pesagem), deu 95,4 kg. Antes estava com 96,2 Kg. Mas, essa semana, deve dar mais, pois estou menstruada e retenho muito líquido, fico inchada”.
Desculpa de peidorreiro
D., então, subiu na balança. Insatisfeito com os números apresentados, o chefe retruca: “Isso (a menstruação) é desculpa de peidorreiro!”. Em seguida, investiga o cotidiano de D. e questiona a frequência dela à academia. “Você está fazendo tudo direitinho? Por que naquele dia, 19h, você estava me mandando mensagem e não fez academia?”. Então, ameaça: ‘Vou te dar uma colher de chá dessa vez, hein? Mês que vem, se não tiver perdido….”.
“A situação chegou nesse ponto de degradação: uma funcionária foi obrigada a compartilhar com seu chefe informações íntimas, referentes ao seu ciclo menstrual para justificar por que não atingiu o peso que ele esperava – e, assim, conseguir receber o dinheiro que lhe era devido”, observou a advogada Grazielle.
Conforme a ação judicial, a moça recebia pouco mais de um salário mínimo. Os R$ 200 eram pagos a título de complementação salarial. A comerciária trabalhou na empresa entre janeiro de 2019 e junho deste ano.
O juiz Marcelo Paes Menezes reconheceu que a trabalhadora foi vítima de assédio moral: “Tenho que a autora foi submetida à violência psicológica extrema, de forma habitual por um período prolongado com a finalidade de desestabilizá-la emocional e profissionalmente. A ação da ré (a loja) colocava em xeque o amor próprio da obreira, ao repugnar seu próprio corpo para atender ao padrão estético do sócio da empresa”.