Por Marcos Aurélio Ruy. Foto: Denisa Sterbova/Cimi
Com homenagem a Dom Pedro Casaldáliga (1928-2020), o Relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2019, lançado nesta quarta-feira (30 de setembro) pelo Conselho Missionário Indigenista (Cimi) denuncia o caráter destruidor do governo de Jair Bolsonaro.
“Este Relatório denuncia o processo de violência sofrida pelos povos indígenas na sua luta pelos direitos e por dignidade”, dizem os dirigentes do Cimi, Antônio Eduardo Cerqueira de Oliveira e Cléber César Buzatto, em texto de apresentação do relatório anual.
“A violência chega de forma planejada ou inesperada, mas na atual realidade, infelizmente, o governo brasileiro tem sido o fomentador, com sua anti-política, do ódio contra os pobres, povos tradicionais e indígenas”, complementam.
Os organizadores do relatório afirmam ainda que os dados apresentados podem ser mais graves, porque são baseados nas informações que conseguiram através da Lei de Acesso à Informação (Lei 12.527/2011) ou por reportagens publicadas pela imprensa e relatos.
Conheça o relatório completo:
Relatório Violência Contra os Povos Indígenas do Brasil – dados de 2019
“Conhecer este relatório é essencial porque deixa transparente a vontade do atual governo em favorecer somente os mais ricos, neste caso, os grandes proprietários de terras, venham de onde vierem”, diz Vânia Marques Pinto, secretária de Políticas Sociais da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).
“São os latifundiários que destroem a natureza com queimadas e desmatamento para implementar pasto para gado e quando muito promover o plantio de soja para a exportação para alimentarem gado na Europa”, argumenta.
A sindicalista baiana, que também é secretária-geral da Federação dos Trabalhadores Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado da Bahia (Fetag-BA), assinala a necessidade de “mostrar à sociedade a importância de se desenvolver uma política agrícola com sustentabilidade e preservação ambiental e manutenção dos povos originários”.
Vânia ressalta também o esvaziamento da Fundação Nacional do Índio (Funai), órgão criado em 1967, e atualmente “atua contra os interesses dos povos indígenas que deveria defender”. Como mostra reportagem da Agência Pública o governo federal vem certificando terras indígenas, neste ano, sem homologação para fazendeiros, sem ao menos dar a chance de diálogo.
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De acordo com o Cimi existem no país, 1.298 terras indígenas, sendo que 829 não têm o processo demarcatório concluído por falta de interesse do Estado. “Essa morosidade perversa intensifica os conflitos por essas terras”, destaca Isis Tavares, presidenta da CTB-AM.
“Crescem os olhos de grandes conglomerados econômicos internacionais aliados a grupos nacionais sobre as riquezas do ecossistema dessas terras”, denuncia.
O relatório aponta terem havido 35 conflitos por direitos territoriais envolvendo as terras indígenas em 2019, além de 256 casos registrados sobre exploração ilegal de recursos naturais, como a extração de madeira e a mineração. Somando esses casos com a falta de homologação das 829 terras indígenas, são 1.120 casos de violência contra o patrimônio dos 305 povos indígenas existentes no Brasil.
Ocorrem muitas denúncias de facilitação da ação de grileiros e garimpeiros pelo governo federal “como forma de abrir caminho para os grandes proprietários de terras, que muitas vezes nem são grupos brasileiros”, acentua Isis.
Saiba como foi o lançamento do relatório
Segundo o relatório, os indígenas sofreram 33 ameaças de morte no ano passado, em 2018 foram 8. Com números que podem ser bem piores, 113 indígenas foram assassinados, com outras 24 tentativas de morte e 10 casos de violência sexual. No total foram 276 casos de “violência contra a pessoa” em 2019, mais que o dobro dos 110 casos ocorridos em 2018, antes da posse de Bolsonaro.
Vânia lembra o descaso com os povos indígenas durante a pandemia do coronavírus, que evidentemente não aparecem no relatório. Segundo a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), órgão governamental, até 24 de setembro, haviam 27.334 contaminados, entre os cerca de 900 mil indígenas existentes no país. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) contabilizava 826 óbitos.
Por isso, “defender os direitos dos povos indígenas em manter as suas terras, sua cultura e suas vidas significa defender as florestas, a natureza, os nosso biomas e a nossa soberania nacional para não entregar as terras brasileiras a grupos estrangeiros”, define Vânia.