Foi publicada no Diário Oficial da União nesta terça-feira (25) a mensagem 476, de 24 de agosto de 2020, comunicando as razões do veto ao PL 735/2020 que dispõe sobre medidas emergenciais de amparo aos agricultores familiares do Brasil para amenizar os impactos socioeconômicos provocados pela pandemia da Covid-19; altera as Leis nos 13.340, de 28 de setembro de 2016, e 13.606, de 09 de janeiro de 2018; e dá outras providências (Lei Assis Carvalho). O PL foi convertido na Lei nº 14.048, de 24 de agosto de 2020.
O governo afirma que vetou o PL 735/2020 por “representar contrariedade ao interesse público e inconstitucionalidade”. Os argumentos são por não mencionar a Declaração de Aptidão do PRONAF (DAP) como instrumento de enquadramento dos(as) beneficiários(as) da Lei – o que não faz sentido porque o art. 1º, parágrafo único, do PL dizia explicitamente que “são beneficiários desta Lei os agricultores(as) familiares ou empreendedores familiares rurais e demais beneficiários da Lei n. 11.326, de 24 de julho de 2006”, como também por não apresentar o impacto orçamentário e financeiro das medidas a serem adotadas.
Causou enorme estranheza quando o governo afirma que não poderia aprovar um abono emergencial para quem não havia acessado o auxílio emergencial conforme a Lei nº 13.982/2020, pois os(as) agricultores(as) familiares “podem ser enquadrados como ‘trabalhador informal’, conforme definição dada pelo inciso II, art. 2º do Decreto nº 10.316, de 2020”. Durante o processo de discussão do PL 873/2020 que incluía a agricultura familiar no auxílio emergencial, vetado pelo governo, a CONTAG solicitou ao mesmo que deixasse clara essa possibilidade alterando o aplicativo ou por outra medida para não prejudicar o segmento na sua condição de segurado(a) especial na previdência por terem recebido o auxílio emergencial cadastrado no aplicativo como autônomo(a). Como isso não aconteceu, a CONTAG e as Federações continuaram orientando à sua base para não se cadastrarem utilizando o aplicativo em razão disso.
Para isso, foi importante o relator ter acatado o PL 2961/2020 de autoria do deputado Carlos Veras (PT-PE), um 25 dos projetos apensados ao PL 735/2020, que justamente visa garantir a manutenção de segurados(as) especiais para os(as) agricultores(as) familiares que acessaram o auxílio emergencial e essa parte não foi vetada. A sua manutenção já deixa evidente que o Movimento Sindical dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais (MSTTR) tinha razão na sua orientação.
A outra parte mantida diz respeito à autorização para quitação em produtos de parcelas vencidas ou vincendas de Cédulas de Produtor Rural (CPRs) da CONAB com vencimento em 2020 e 2021 por organizações de agricultores(as) familiares que tiveram a comercialização da produção prejudicada pela pandemia.
Foi vetado também o art. 8º que tratada do Garantia Safra. A proposta dizia que ficava garantido benefício automaticamente aos agricultores(as) familiares quando comprovada a perda de safra por meio da apresentação de laudo técnico de vistoria municipal. A CONTAG já havia chamado a atenção do relator e do Congresso a esse artigo porque a portaria nº 11 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) já determinava, em razão da impossibilidade de termos laudos municipais em razão da pandemia, a sua substituição por um dos índices apurados pelo CEMADEN, IBGE ou INMET na safra 2019/2020.
O art. 2º, inciso II do Decreto 10.316/2020 só fala da caracterização de trabalho informal fazendo referência ao empregado, ao empregado(a) intermitente, exercício da atividade profissional na condição de autônomo e a quem está desempregado(a). Em nenhum momento trata da Lei nº 11.326/2006. Ademais, durante a apreciação dos vetos ao PL 873/2020 e ao PLV 30/2019 que tratava da prorrogação de dívidas da agricultura familiar no âmbito dos Fundos Constitucionais, ficou acordado pela Câmara juntamente com o relator e a liderança do governo a manutenção dos vetos porque o PL 735/2020 seria aprovado sem vetos por estar mais completo. Mais uma vez o compromisso não foi mantido, a exemplo daquele de aprovar um Plano Safra específico para a agricultura familiar.
A proposta resultou de uma ampla unidade e articulação das entidades do campo juntamente com entidades ambientais e de apoio à agricultura familiar, artistas e entidades urbanas sob a liderança dos partidos de oposição e da Frente Parlamentar da Agricultura, coordenada pelos deputados Heitor Schuch (PSB-RS), Vilson da FETAEMG (PSB-MG) e Carlos Veras (PT-PE).
Foi aprovada por ampla maioria dos partidos na Câmara e no Senado, inclusive abrindo mão de projetos importantes apresentados na mesma perspectiva e emendas para garantir a celeridade na sua aprovação. Representava uma medida efetiva de esperança para aliviar os prejuízos da agricultura familiar causados pela pandemia do novo coronavírus (Covid-19), o setor mais estratégico do país responsável 70% dos alimentos que vão à mesa dos(as) brasileiros e brasileiras, mas com a pandemia 51% dos agricultores(as) familiares tiveram redução nas suas rendas, perdendo em média 35% da renda que habitualmente recebia a família (IBGE, PNAD COVID-19, elaboração da CEGAF/UnB). As perdas são variadas por setores: hortaliças (queda de 70%), queijos e outros derivados do leite (42%), frutas (35%), carnes (32%), leite (25%). A perda média na comercialização é de 40%
A agricultura familiar brasileira, sozinha, responde pela oitava maior produção de alimentos do planeta segundo dados do Banco Mundial e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, com faturamento anual de US$ 55,2 bilhões. Colabora para a geração de renda e emprego no campo, como confirma o último Censo Agropecuário 2017, apontando que esse modelo de produção responde por cerca de 70% do total de pessoas ocupadas no campo e por 23% do valor total da produção dos estabelecimentos agropecuários do país.
Por tudo isso, o governo só mostra mais uma vez o total descompromisso com a agricultura familiar pela sua importância social e econômica para o país. Isso vai prejudicar a produção de alimentos para abastecer o mercado interno, que já estão reduzindo nas prateleiras dos supermercados e os preços estão aumentando para o(a) consumidor(a), o que limita a nossa condição de ajudar o país a sair da crise garantindo alimentos, produto essencial considerado pelo próprio governo por meio do Decreto
Iremos fazer toda a articulação necessária para denunciar mais esse descaso com a agricultura familiar à imprensa e à sociedade. E principalmente mobilizar as bancadas e lideranças do Congresso Nacional para apreciar o veto e derrubá-lo.
Reunidas na Assembleia Geral Extraordinária da CONTAG, em 25 de agosto de 2020 de forma virtual, CONTAG e suas 27 Federações filiadas, representando mais de 04 mil Sindicatos e 15 milhões de agricultores e agricultoras familiares, assinam a referida Nota e se manterão em luta pelo reconhecimento e valorização da agricultura familiar brasileira.
Fonte: Direção da Contag