Por Marcos Aurélio Ruy
O Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) lançou Nota Técnica com avaliação sobre o trabalho doméstico durante a pandemia da Covid-19.
A nota confirma as palavras da vice-presidenta da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil, seção Pará (CTB-PA), Lucileide Mafra Reis, que também é presidenta da Federação das Trabalhadoras Domésticas da Região Amazônica.
Para ela, “as trabalhadoras domésticas já sentiam o retrocesso em suas condições de trabalho e seus salários, principalmente após a aprovação da reforma trabalhista em 2017 (Lei 13.467)”. Ainda de acordo com a sindicalista, “a quarentena agravou a situação com o aumento do desemprego e a precariedade das condições de trabalho, expondo as trabalhadoras a condições quase subumanas de trabalho”.
O Dieese informa em sua nota que o trabalho doméstico está entre os masi atingidos pelos efeitos da pandemia. “o emprego doméstico, que se caracteriza por altos níveis de informalidade, baixos salários e desproteção social e sindical, dada a circunscrição da relação de trabalho aos domicílios dos empregadores”.
No Brasil, como apontam diversos historiadores, o trabalho doméstico remete à escravidão porque mesmo após Abolição, em 1888, as ex-escravas foram mantidas em seus trabalhos domésticos, tornando-se em muitos casos, o sustentáculo de suas famílias. Mas “a visão escravista dos empregadores permanece”, garante a sindicalista paraense.
Por isso, diz ela, “as trabalhadoras enfrentam o assédio moral e sexual e sentem dificuldade para o enfrentamento com medo de perder o emprego, mesmo mal remunerado e precário”.
O trabalho doméstico abrange cozinhar, limpar a casa, cuidar de crianças e idosos, lavar e passar roupa e trabalhos de jardinagem e governança, mostra o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mas 77,5% são contratadas para os serviços gerais, ou seja, “fazem de tudo, sem jornada de trabalho estabelecida e com remuneração extremamente baixa”, destaca Lucileide.
De acordo com o IBGE. em 2018, eram 6,23 milhões trabalhadoras domésticas, concentradas em 19,5% dos lares brasileiros e apenas 27% desse total com carteira assinada e férias remuneradas, horas de descanso, jornada respeitada, entre outros direitos garantidos.
Uma atividade considerada tipicamente feminina por conter em seus quadros 92,7% de mulheres, sendo 65% mulheres negras.
Pelo histórico do trabalho doméstico no país com maior número de trabalhadoras no mundo, a categoria mudou com o tempo, mas “vem retrocedendo por causa dos efeitos da reforma trabalhista, do desemprego e pela política neoliberal de Paulo Guedes (ministro da Economia)”, assinala Lucileide.
Como aponta o estudo do Dieese, nos anos 1990 a média de idade das trabalhadoras domésticas não ultrapassava os 24 anos. A sindicalista conta que “era muito comum as famílias buscarem meninas em suas casas no interior para serem tratadas ‘como se fossem da família’, mas na verdade, sujeitas a jornadas abusivas e outros tipos de maus-tratos”.
Ela afirma e a Nota do Dieese confirma que as relações trabalhistas foram mudando com as políticas públicas dos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. “As meninas foram para a escola e partiram para outras atividades com melhor remuneração, mas com o abandono dessas políticas e o crescimento do desemprego e da precariedade do trabalho, as meninas estão voltando e enfrentando os mesmos tipos de abusos”, assegura Lucileide.
Com isso, a média salarial dessa categoria vem despencando. Em 2018, de acordo com o IBGE, a média salarial da categoria foi de R$ 858,42, 10% a menos que o salário mínimo da época, que era de R$ 954. As babás tinham média ainda mais baixa, de R$ 664,63. Não existe novo estudo para analisar a situação atual.
A conclusão do Dieese é de que a pandemia agravou uma situação que já vinha se deteriorando e as trabalhadoras domésticas estão praticamente desassistidas por não terem onde reclamar os seus direitos, alega Lucileide. “A situação que já era difícil antes de Jair Bolsonaro assumir piorou com suas políticas contra os mais pobres e com a pandemia piorou ainda mais”.
Tanto que o Ministério Público do Trabalho publicou a Nota Técnica com orientações aos empregadores para dispensarem as trabalhadoras com garantia de pagamento de seus salários e quando a presença ao trabalho for indispensável, manter condições seguras com equipamento de proteção individual para evitar a contaminação. A nota indica também a legalização da situação das trabalhadoras com registro em carteira e respeito aos direitos trabalhistas e sociais como forma de ter condições de trabalho que respeitem a condição humana das pessoas.
“Mais do que nunca as trabalhadoras domésticas precisam de mobilização e unidade para enfrentar os retrocessos em nossos direitos”, defende Lucileide. “O movimento sindical deve agir para levar informação a essa categoria constituída em grande parte por pessoas com pouca escolaridade”.