Por Alex Saratt e Igor Corrêa Pereira
Estamos enfrentando um inimigo e não um adversário. Bolsonaro é um fascista. Ele não é alguém para se enfrentar dentro das regras normais democráticas. Numa situação normal, se ele fosse um adversário, ver sua popularidade enfraquecer e aguardar as próximas eleições seria uma boa pedida. Mas não é esse o caso. Bolsonaro já deu sinais demais de que trabalha diariamente pela morte das pessoas e pela ruptura das instituições. É isto que o faz inimigo e não adversário. Ele opera fora dos parâmetros do Estado Democrático de Direito. Essa diferença deve mudar completamente a forma de ação.
Se ele é um inimigo por ameaçar a vida e a democracia, deve ser derrotado imediatamente. Não podemos aguardar 2022, pois nem mesmo é garantido que em 2022 haverá eleições ou em que condições elas ocorrerão. Isto posto, qual é a forma de isolá-lo? De qual jeito podemos unir o maior contingente social em torno de um Fora Bolsonaro? É pela vida e pela democracia? Ou é pela economia?
É muito mais fácil hoje encontrar pessoas e organizações que concordem que a vida e a democracia devem prevalecer, do que encontrar um consenso em torno de uma agenda econômica. Portanto, hoje, para derrubar Bolsonaro, a agenda mínima de salvação da vida e da democracia é o que pode criar um consenso mais amplo para derrubá-lo. É preciso ser realista se quisermos derrotar o fascismo. Somente uma frente de esquerda pode cumprir a tarefa de derrotar Bolsonaro? Sabemos que não.
Há uma clara e surpreendente cisão no campo da Direita. A burguesia obviamente se unifica no projeto econômico, mas divide-se no aspecto político. Portanto, é na Política e não na Economia que reside a contradição e a brecha (que não ficará à espera da nossa decisão, o risco de uma solução de compromisso entre os pares é real). Superar o golpe e ditadura fascistas abertamente anunciados é a condição básica para pautar ações mais radicalizadas. Sem vencer essa etapa da luta social, as demais são inalcançáveis.
Estabelecer que não se assina qualquer coisa é legítimo, mas outrora se deu fé a um documento que baseou parte significativa do modelo econômico do país com uma carta-compromisso intitulada “Carta Ao Povo Brasileiro” e se optou em substituir o “Fora FMI!” pelo “Pago o FMI” e isso não significou um pecado capital. Aliás, o tripé superávit primário, dólar flutuante e juros altos ficaram praticamente intactos. Não se fala isso por deaforo, só se constata a dura realidade, sem esquecer de mencionar que mesmo nessa adversidade se produziu uma bela experiência de diminuição da pobreza e valorização do salário dos trabalhadores.
A rigidez que se exige hoje para formar uma Frente Ampla que nos livre do arbítrio, da repressão e da morte e abra caminhos para retomar o protagonismo e a iniciativa me parece muito mais um propósito específico do que uma leitura responsável da realidade. Evocar o isolamento ou reivindicar a primazia não contribuem para a luta geral e em perspectiva.
Não devemos cultivar ilusões ou fantasias, mas temos a obrigação de atuar no leito real da luta de classes. A recusa ao discurso fácil e acusatório, bem como a grandeza de acomodar o diverso, o antagônico e o contraditório dentro das movimentações para fora da bolha e dos aplausos da claque, deveria ser o caminho. Mas para isso, as lideranças precisam escolher: preferem estar certas ou derrotar o fascismo? Bolsonaro é um inimigo ou um adversário? Existe normalidade democrática para aguardar derrotá-lo numa eleição normal e bonitinha em 2022 ou é preciso afastar a ameaça fascista o quanto antes?
Igor Corrêa Pereira é técnico em assuntos educacionais e mestrando em educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Membro da direção estadual da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) do Rio Grande do Sul.
Alex Saratt é professor de História e dirigente sindical do Cpers/Sindicato (32o núcleo/Taquara)