O Brasil deve encerrar esta primeira semana de maio registrando mais de 10 mil mortes pelo coronavírus e o presidente da República, Jair Bolsonaro, na contramão da ciência e do bom senso, depois de berrar “E daí?” para as vítimas da doença chegou a anunciar que patrocinaria um churrasco no Palácio do Planalto sábado (9) para “mais ou menos 30 pessoas”.
Seria uma comemoração macabra no momento em que milhares de famílias choram seus mortos e milhões estão isolados em casa, em respeito à vida e às orientações da comunidade científica e da Organização Mundial de Saúde (OMS). Mas diante da repercussão negativa do anúncio, que despertou uma saraivada de críticas e ironias, Bolsonaro voltou atrás e cancelou a insólita churrascada que celebraria a morte em vez da vida.
Aliado do coronavírus
Vivemos mais uma semana sinistra por conta do líder da extrema direita. Já no domingo (3) ele saiu às ruas em Brasília para participar de uma manifestação de cunho fascista infestada de faixas pedindo intervenção militar, o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. Vociferou, na ocasião, que já perdeu a paciência e não vai mais admitir “interferências”, numa ostensiva ameaça aos poderes judiciário e legislativo.
Na quinta (7), Bolsonaro liderou uma caminhada em Brasília até o STF, acompanhado por líderes empresariais e pelo ministro da Economia. Chegou de surpresa e forçou uma reunião de última hora com o presidente da Corte, Dias Toffoli, cujo propósito foi pressionar pelo fim do isolamento social adotado em muitos estados e municípios com respaldo do Supremo, a despeito da vontade do obscuro político neofascista.
Na mesma quinta, a revista científica inglesa The Lancet considerou o chefe do Executivo brasileiro como “a maior ameaça ao combate ao coronavírus”, que com seu sinistro e insano comportamento “semeia confusão, desprezando e desencorajando abertamente as medidas de distanciamento físico e confinamento”. Uma triste desmoralização. A imagem do nosso país nunca esteve tão suja e em baixa no mundo.
Mais do que o notório espírito fascista, as bravatas e ameaças revelam um presidente medroso, apavorado com os podres e crimes do Clã que estão vindo à tona e podem resultar em seu afastamento.
Perguntas que não calam
Dizem que perguntar não ofende: por que Bolsonaro reluta em mostrar o resultado do exame que fez para saber se tinha sido infectado pelo coronavírus? Ele disse que não foi contagiado, mas as tentativas reiteradas da AGU de reverter a decisão judicial que ordena a divulgação do exame sugerem fortemente que o presidente está mentindo.
Se testou positivo, como parece, andou criminosa e impunemente disseminando a doença, além de mentir descaradamente para o povo, o que não é novidade. A verdade pode ter ser devastadora para seu projeto autoritário.
Note-se que mesmo seu ídolo Donald Trump submeteu-se ao exame e não vacilou em divulgar seu resultado. Neste caso, Bolsonaro achou mais conveniente não seguir seu exemplo. O motivo está transparecendo.
O governo também tem medo de mostrar o vídeo citado por Sergio Moro como prova de suas denúncias e também não mede esforços para contornar a determinação do STF de que a gravação lhe seja enviada.
Dizem que a reunião foi pródiga em palavrões e teria como um destaque as pesadas ofensas do ministro da Educação, o lastimável Abraham Weintraub, aos juízes do Supremo Tribunal Federal.
Em meio às especulações sobre o conteúdo do vídeo uma certeza se impõe: a de que contém conversas desabonadoras e comprometedoras para o presidente e outros membros do seu desastrado governo.
Até quando?
Finalmente, o líder neofascista demonstrou que continua inconformado com a decisão do ministro Alexandre Moraes, do STF, e ainda insiste na nomeação do amigo Ramagem para o comando da PF. Criou uma situação constrangedora para o novo diretor geral da instituição, delegado Rolando de Souza, que ele próprio indicou a contragosto mas, pelo que se vê, não conta com a confiança do Clã.
No final da tarde, Moraes Moraes rejeitou o pedido de reconsideração da decisão de 29 de abril que impediu a posse do policial amigo do Clã, feito pela Advocacia-Geral da União (AGU).
Naquela sentença, o ministro do STF disse ver indícios de “desvio de finalidade” na indicação do delegado. Agora Moraes também decidiu arquivar o processo. Uma nova derrota que Bolsonaro terá de engolir e digerir no churrasco de sábado.
Embora tenha sido eleito para o cargo com a decisiva colaboração do ex-ministro Sergio Moro, que tirou Lula do páreo, Bolsonaro não reúne as mínimas condições para exercer a Presidência.
Resta a pergunta: até quando seremos obrigados a suportá-lo?
Umberto Martins