Soa falso, para quem acompanha a vida política nacional, ver as organizações Globo afirmar, em editorial, que não alimentam mais nenhuma “ilusão” com Bolsonaro, por “não comungar dos valores democráticos mais básicos”. Ora, se não alimenta mais, é porque já alimentou.
Em outras palavras, mesmo sabendo de quem se tratava, de ser um político que, a bem da verdade, nunca escondeu e nem esconde os valores, mais do que conservadores, reacionários, que o orientam, a Globo o apoiou incondicionalmente na eleição presidencial.
Esse papo agora de que Bolsonaro ameaça a democracia é conversa fiada, por puro desentendimento na partilha do espólio do golpe, tanto o de 2016, no impeachment sem crime de responsabilidade comprovado, como na eleição presidencial do ano passado, fraudada na inabilitação ilegal de Lula, líder disparado em todas as pesquisas, e na manipulação da opinião pública via fake news.
Dois episódios vergonhosos da história brasileira recente que a Globo não apenas apoiou, mas, acima de tudo, foi protagonista. Exerceu papel preponderante. Aliás, toda a mídia comercial no Brasil, com raríssimas exceções. E tem mais, quando se trata da agenda econômica ultraliberal, que corta direitos, desmonta o Estado e entrega a riqueza nacional às grandes corporações, aí não há divergências, Bolsonaro está correto e levando o Brasil para o caminho da tal “modernidade”.
Quando assumiu a conspiração que, por via golpista, deslocou as forças progressistas do poder central, em 2016, a Globo tinha somente três anos que havia usado a televisão e o jornal, em setembro de 2013, para pedir desculpa pública à nação por ter apoiado a ditadura civil militar (1964-1986). Quase meio século depois, 49 anos. Reincidência. E voltará a reincidir, sempre que necessário para golpear qualquer projeto político com apelo popular.
O espírito antidemocrático, golpista, é da natureza não só da Globo, mas de toda a mídia, enfim das elites nativas – políticas, econômicas e militares -, que nunca superaram a formação imposta pelo colonialismo, baseada na submissão incondicional à metrópole e na negação de um Brasil altivo, soberano. Não em vão, criticam o presidente, mas enaltecem o ultraliberalismo, o entreguismo, o neofascismo, as medidas de exceções, as violações à vontade popular.
São cisões dentro da extrema direita que não podem ser desprezadas pela resistência democrática, mas sem perder de vista que resultam do oportunismo, da usura e da hipocrisia. Pelo bem da democracia pautada no compromisso com a responsabilidade social.
*Rogaciano Medeiros é jornalista, integrante do Movimento Comunicação pela Democracia