O Ministério do Meio Ambiente da gestão Jair Bolsonaro (PSL) tinha em mãos um manual para implantar o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo em Águas sob Jurisdição Nacional, o PNC. Mas o governo cometeu uma série de violações nos processos listados no documento ao reagir ao derramamento no Nordeste. Se observados, os critérios levariam ao acionamento do plano em 2 de setembro – mas a medida só ocorreu 41 dias depois, em 11 de outubro.
O Manual do PNC foi confeccionado por exigência de um decreto presidencial de 2013 (governo Dilma Rousseff). Sua primeira versão completa, concluída em 2018, não chegou a ser publicado oficialmente e está limitada a um círculo restrito da cúpula de MMA, Ibama, Marinha e ANP (Agência Nacional do Petróleo). O Plano – ao qual o jornal O Globo teve acesso – não foi sequer compartilhado com estados e municípios que atuam na contenção do óleo.
Analisando o manual, O Globo aponta ao menos oito violações de procedimento ao comparar a ação do governo com o texto da obra, que tem força legal. Além de mapear a rede de articulação do governo necessária ao monitoramento da costa para incidentes com óleo, o manual lista os critérios para implantação do PNC, um instrumento para emergência de caráter nacional. Dos 35 critérios listados, há ao menos 18 que se cumpriam ou eram fruto de dúvida no início de outubro, quando o plano ainda não havia sido acionado.
Essas violações de procedimento se somam ao problema gerado em abril pela revogação de dois comitês de reação ao incidente com óleo, exigências do decreto de 2013. O governo não anunciou ainda a recomposição desses dois órgãos, essenciais na implementação do plano.
O processo decisório para implantar o plano de contingência poderia ter sido iniciado em 30 de agosto, algo que o manual prevê quando “há risco de toque de óleo na costa brasileira”. Naquele dia, quatro praias em Conde (PB) amanheceram oleadas. Em 2 de setembro, o derramamento já era emergência interestadual, com 19 praias oleadas em três estados diferentes, Pernambuco, Sergipe e Paraíba.
O ex-ministro do Meio Ambiente Carlos Minc – que deu início ao processo de elaboração do PNC, em 2010 – diz que o atual ocupante da pasta, Ricardo Salles, viola ao menos 13 dos 23 artigos do decreto que, em 2013, instituíram o plano. Alguns órgãos e equipes especializadas não foram mobilizadas a tempo, e a investigação sobre a amplitude do desastre foi comprometida, bem como sua limpeza.
“Nenhum plano de contingência anularia completamente o impacto do óleo sobre as praias, mas poderia reduzi-lo significativamente”, diz Minc. “Era preciso acionar órgãos estaduais, que têm suas defesas civis, chamar a Petrobras e jogar boias que podem captar qualquer tipo de óleo, mesmo o superficial.”
Suely Araújo, ex-presidente do Ibama, assinala que “o ritual estabelecido pelo manual não está sendo seguido”. Como o governo demorou para acionar o plano de emergência, algumas etapas essenciais para mitigar o desastre não podem mais ser recuperadas. “O PNC sofreu problemas devido à desestruturação organizacional do ministério, que perdeu os colegiados relacionados à reação contra incidentes de poluição por óleo. A resposta veio muito tarde”, lamenta.
“Não houve medidas preventivas para evitar a chegada e difusão da substância pelo litoral, não se sabe quando ele chegará às [outras] praias. nem qual é a verba necessária para as operações ou de onde virão os recursos”, agrega Suely. A esta altura, segundo ela, o ministério não pode se restringir a medidas descritas em manuais – e deve assumir a articulação com órgãos estaduais e autoridades internacionais.
Um dos sinais do descompasso entre a União e o poder local é um ofício entregue na segunda-feira pelo secretário de Meio Ambiente de Pernambuco, José Antônio Bertotti Jr., a Salles. Bertotti alertava que era “necessário maior apoio do governo federal” e pedia “urgentemente uma resposta, diante da gravidade da situação”. O MMA ainda não atendeu à solicitação.
Entre as 35 perguntas listadas no manual do PNC como critério para ativar o plano, há pontos a serem verificados: “Há possibilidade de o óleo afetar área de importância socioeconômica?”; “Há possibilidade de identificar o poluidor?”. O grau de risco medido por tais questões determinaria a ativação mais ágil do PNC, o que não ocorreu.
É importante frisar, que em meio ao desastre ambiental, o Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, insinuou que óleo derramado há mais de 50 dias teria sido derramado por um navio do Greenpeace. A ONG foi até à Justiça posteriormente à declaração do Ministro.
Com informações do O Globo.
Via Portal Vermelho