Na racionalidade, não deixa de ser um despropósito, chamar de bolsonarismo a onda ultraconservadora que tomou conta do Brasil ultimamente, consequência do recrudescimento da extrema direita no mundo, impulsionada pela nova forma de reprodução do capital. Isso, claro, dentro de uma análise sociológica. Nunca teve sustentação popular majoritária inquestionável, não se movimenta em torno de ideias, conceitos, ações planejadas e muito menos atua orientado por um projeto de nação.
Não em vão, o presidente Bolsonaro faz sempre questão de ressaltar a submissão irresponsável do governo brasileiro aos interesses norte-americanos. Pois bem, a pesquisa Vox Populi, divulgada no final de semana, comprova que o tal do bolsonarismo não passa de delírio de uma ínfima minoria da população. Somente 6% admitem ser bolsonaristas, percentual insignificante para justificar a expressão. Não tem estofo para tanto e nem poderia ter.
É sempre bom não esquecer que Bolsonaro não passa de um acidente de percurso na turbulenta conjuntura política nacional. O golpe jurídico-parlamentar-midiático de 2016 foi dado com a intenção de reconduzir o PSDB ao poder central, a fim de impor a agenda ultraliberal, como fez Temer. Acontece que os planos fracassaram, devido, entre outros fatores, ao discurso de criminalização da política feito para moldar a opinião pública em apoio à conspiração golpista, que teve na Lava Jato e na mídia duas ferramentas decisivas. Com Lula preso e na despolitização que se fez moda, abriu-se espaço para o pesadelo ultraconservador.
Sem nome competitivo e na iminência de mais uma vitória, nas urnas, das forças progressistas – seria a quinta consecutiva -, o que jogaria o golpe na lata do lixo, as elites não tiveram outra alternativa senão assumir Bolsonaro. Hoje, uma boa parte se diz arrependida. Mas, despreparado e tosco, o presidente termina por dificultar a aprovação da pauta econômica ultraliberal e não consegue aproveitar a oportunidade para se afirmar como uma liderança, mesmo de extrema direita, que possa ser levada a sério em nível nacional e internacional. Muito pelo contrário. O vexame na ONU o carimbou para o mundo como um louco perigoso que precisa ser contido, urgentemente, pelo bem da própria civilização ocidental, do liberalismo político e de mercado.
O neofascismo que tanto infelicita o Brasil, baseado na extinção de direitos, na supressão das liberdades e na imposição do Estado policial, a fim de acelerar o fluxo do capital e maximizar os lucros, vai bem além de Bolsonaro, que não passa de uma mera peça de reposição no projeto de poder do capitalismo financeiro. Portanto, falar em bolsonarismo é dar a Bolsonaro uma dimensão que ele não tem.
O importante mesmo neste momento é juntar todos, todas e tudo que possam fortalecer a resistência democrática, a fim de derrotar o neofascismo, o mais rápido possível. Agora, se Bolsonaro vai concluir o mandato ou se reeleger em 2022, se Moro e Dallagnol serão demitidos e até presos, se Lula vai voltar à presidência, se o Bahia vai conseguir a vaga para a Libertadores ou se o Vitória vai subir, aí são outras conversas.
* Rogaciano Medeiros é jornalista, integrante do Movimento Comunicação pela Democracia*