O Brasil ainda vai ver cada um se eleger o operário patrão; música

Por Marcos Aurélio Ruy

Na música Xote Bandeiroso, de autoria de Laert Sarrumor, o grupo Língua de Trapo promete que “esse Brasil-criança um dia vai ver/Cada um se eleger/O operário patrão”. Nesta canção, o grupo parece homenagear o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, quando ele ainda era apenas um líder sindical. Xote Bandeiroso é de 1982. Lembrando que Lula despontou para o país durante as greves metalúrgicas de 1978, 1979 e 1980 no ABC Paulista contra a ditadura (1964-1985).

Quando eu vim
lá do Nordeste,
eu era cabra da peste
Patola e folgazão
Trabalhando noite e dia,
nem sabia que existia
O índice da produção

O Língua de Trapo surgiu em 1979 como parte integrante de grupos e autores independentes do Teatro Lira Paulistana, muito atuante nos anos 1980. Além do Língua, despontaram no Lira, Itamar Assunção, Arrigo Barnabé, Premeditando o Breque e Grupo Rumo, entre outros.

e em cada emprego que arrumava
mudei minha posição
Da imprensa
perdi o medo,
na prensa perdi o dedo,
fui ganhando instrução
Sempre bom cabra-da-peste,
botei medo na Fiesp
firme na negociação

E para deixar mais evidente:

Eles ainda me dizem:
Severino
bom menino,
deixa de subversão
Tu acaba na cadeia (…)

Xote Bandeiroso, de Laert Sarrumor, grupo Língua de Trapo

Já uma canção Cabide de Molambo, de 1932 canta a penúria do trabalhador desempregado. João da Baiana (1887-1974) e Patrício Teixeira (1893-1972) mostram claramente a penúria remanescentes da escravidão, largados à própria sorte após a Abolição, em 1888. O Brasil foi o último país do Ocidente a pôr fim ao sistema escravista que durou quase quatro séculos de exploração desumana.

Meu Deus eu ando
Com sapato furado
Tenho a mania
De andar engravatado

A minha cama é um pedaço de esteira
E uma lata velha, que me serve de cadeira


Molambo é um termo de origem angolana, utilizado atualmente como um sinônimo de farrapo ou maltrapilho.

E os músicos e poetas prosseguem com uma crítica ácida sobre a marginalização da população negra pro um pretenso branqueamento da sociedade.

A refeição
É que é interessante
Na tendinha do Tinoco
No pedir eu sou constante
Seu português
Meu amigo sem orgulho
Me sacode um caldo grosso
Carregado no entulho

Cabide de Molambo, de João da Baiana e Patrício Teixeira

Já o cantor e compositor ingês Billy Bragg na canção There Is Power In a Union (Há poder em um sindicato) canta a necessidade de união da classe trabalhadora para fazer valer os seus direitos. E para isso:

Há poder em uma fábrica, o poder na terra
O poder nas mãos de um trabalhador
Mas tudo não significa nada se juntos, não resistem
Há poder na União
(…)
A União sempre para defender nossos direitos
para baixo com o pé negro, todos os trabalhadores devem se unir
Com nossos irmãos e irmãs de muitas terras distantes
Há poder em uma União

Bragg é um ativista político pelos Direitos Humanos e da classe trabalhadora. Seu rock é mesclado com folk music, punk rock e música de protesto. A sua palavra cantada mostra a vontade de superar a exploração do trabalho pelo capital.

There Is Power In a Union (Há poder em um sindicato), de Billy Bragg

As três canções se apresentam temas atuais e espinhosos como a repressão à classe trabalhadora e sua organização sindical e a luta para fugir do desemprego e ter uma vida digna.

Fonte: Rádio Peão Brasil