Por Marcos Aurélio Ruy*
Dados divulgados, nesta quarta-feira (22), pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBGE, mostram que não há exagero nesse título.
“A crise assola o país desde 2015, mas as soluções propostas pelo presidente golpista Michel Temer, a partir de 2016 fizeram a crise se aprofundar”, diz Vânia Marques Pinto, secretária de Políticas Sociais da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).
Para ela, com a eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República no ano passado, “a tendência é de piorar muito a situação porque não há projeto de desenvolvimento nacional com valorização do trabalho e combate à miséria”.
A agricultora familiar baiana se refere à informação do crescimento de famílias usando lenha ou carvão para cozinhar, se expondo a riscos, porque o gás de cozinha está inacessível aos mais pobres. O preço médio do botijão de gás de 13 quilos está em R$ 80 (em muitos lugares o preço do gás já ultrapassa os R$ 100). Além disso, a gasolina beira os R$ 5 e o preço dos alimentos sobe.
Por isso, a Pnad Contínua mostra que 14 milhões de lares estão utilizando o carvão e a lenha para cozinhar. “Fruto do preço abusivo botijão de gás, do desemprego galopante, do fim da política de valorização do salário mínimo e da falta de perspectivas para a população mais vulnerável”. Acentua Vânia.
A pesquisa mostra também que houve crescimento de 27% na utilização da lenha e carvão em substituição ao gás de cozinha nos últimos dois anos. Na região Sudeste, onde o desemprego avança assustadoramente houve aumento de 60% de famílias que abandonam o gás de cozinha por falta de dinheiro, um contingente de quase 3 milhões de famílias em 2018.
Em fevereiro, a taxa de desemprego era de 12,4%, atingindo perto de 14 milhões de pessoas, além de cerca de 27 milhões estarem na condição de subemprego e “o presidente corta verbas da educação pública para chantagear a sociedade com vista à aprovação de uma reforma da previdência que representa o fim da aposentadoria e da Previdência pública”, afirma Francisca Rocha, secretária de Assuntos Educacionais e Culturais da Apeoesp – Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo.
De acordo com o levantamento da Fundação Abrinq, “Cenário da Criança e do Adolescente 2019”, 9,4 milhões de pessoas entre 0 e 14 anos vivem em estado de extrema pobreza, com renda familiar per capita de R$ 234,25 por mês.
“A crise veio e com ela uma redução da rede de proteção social e a contração da economia, que, levou o salário mínimo a ficar sem ajuste real”, reforça Renato Meirelles, presidente do Instituto de Pesquisa Locomotiva, ao jornal Valor.
Outro dado importante que mostra o rápido empobrecimento da população aferido pela Pnad mostra que em 2016, 74,4% das famílias possuíam casa própria. Esse índice caiu para 72,6% em 2018. Mais de 19 milhões de famílias atualmente pagam aluguel ou moram de favor, em 2016 eram 17,7 milhões.
“A geração futura vai partir de uma base pior. Quando você vem num processo de melhoria, mesmo que pequena, a perspectiva é de crescer. No entanto, o que temos é um quadro de recuperar o que foi perdido e essa conjuntura é especialmente prejudicial à primeira infância”, diz Meirelles.
Já Celina Arêas, secretária da Mulher Trabalhadora da CTB, assinala que a crise atinge mais as mulheres. “Na maioria dos lares, são as mulheres que cuidam dos afazeres domésticos, mesmo trabalhando fora. São as mulheres que cozinham e têm a necessidade de adaptar o paladar ao orçamento doméstico”.
Cada vez mais mulheres chefiam os lares, Em 2012, 37% delas eram chefes de família, atualmente as mulheres chefiam 45 dos lares. Para a professora mineira, “mesmo assim continuam sofrendo preconceito, violência e a dupla jornada de trabalho”.
A questão dos saneamento básico também piorou. Segundo a Pnad Contínua, não ano passado 72,4 milhões de pessoas brasileiros viviam em domicílios sem acesso à rede coletora de esgoto frente a 72,1 milhões em 2017, crescimento de 300 mil pessoas em um ano somente. Vânia lembra que “isso significa que as pessoas estão deixando suas casas para morar mais longe em condições mais precárias”.
“A proposta de privatizar tanto o saneamento básico quanto a água dificultam ainda mais a vida das brasileiras e brasileiros”, assinala. Ela lembra ainda que os dados da Pnad mostram também que 9,7% da população vivem em residências sem coleta de lixo, “agravando a probabilidade de aumento de doenças”.
Para Vânia, “a população não aguenta mais os retrocessos trazidos pelo golpe de Estado de 2016 reforçados pela eleição de Bolsonaro”. De acordo com ela, “a resposta está vindo das ruas com estudantes defendendo a educação pública e trabalhadoras e trabalhadores se organizando para realizar uma grande greve geral do dia 14 de junho contra as políticas neoliberais que cortam direitos”.
*Marcos Aurélio Ruy é jornalista.