Por Altamiro Borges*
Desconfie sempre das “otoridades” que rosnam contra a corrupção e se dizem seguidoras do “ético” Jair Bolsonaro – inclusive dos padres, bispos e pastores. Na quarta-feira (20), por ordem direta do Papa Francisco, o goiano Jean Rogers Rodrigo de Sousa, mais conhecido como padre Rodrigo Maria, perdeu o status clerical. Ordenado sacerdote há 19 anos, ele foi acusado por ex-freiras e ex-noviças de ter cometido crimes de abuso sexual e agora é expulso da Igreja Católica. A punição, a mais dura que o Vaticano pode impor a um clérigo, é o desfecho de uma longa investigação canônica e atinge o religioso que, após ser transferido para inúmeras dioceses, atualmente respondia aos bispos da cidade paraguaia de Ciudad del Este.
“O sacerdote Jean Rogers Rodrigo de Sousa, desta diocese, recebeu do Santo Padre o decreto de perda do estado clerical e a dispensa das obrigações correspondentes”, diz o comunicado assinado pelo monsenhor Guillermo Steckling. O agora expulso padre Rodrigo Maria foi citado como molestador de ao menos 11 mulheres. Desde meados de 2006 que já pairavam denúncias contra o clérigo. Na época, ele liderava uma comunidade católica em Anápolis (GO), a Arca de Maria, e foi acusado de fazer lavagem cerebral em jovens que recrutava para a missão religiosa. Uma ex-noviça narrou à Folha que “ela e colegas raspavam a cabeça e passavam a rejeitar as famílias e, se cometessem alguma ‘rebeldia’, eram castigadas pelo padre – que, segundo ela, as submetia à dieta de pão e água. Depois vieram denúncias de conduta sexual criminosa, de estupro a masturbação no meio de um papo virtual”.
“Uma ex-freira disse à Folha, pedindo para ter seu nome preservado, que o episódio aconteceu há cerca de cinco anos, quando os dois se falavam pela internet. ‘Aí ele baixou [a roupa] e se masturbou, e nisso eu imediatamente desliguei o Skype’. Antes, ela tirou um print da conversa – a imagem foi anexada aos autos do processo canônico. Há processos contra o ex-padre correndo em sigilo na Justiça comum, todos ainda sem veredicto. No ano passado, Jean disse à reportagem que era alvo ‘de calúnia há algum tempo, razão pela qual estou processando criminalmente 11 [mulheres que o acusam]’. A Folha não conseguiu novo contato com ele ou seu advogado nesta quarta-feira”.
De raspão, sem fazer maior escarcéu, a Folha registra apenas que “em redes sociais, o padre já elogiou Jair Bolsonaro e pediu ‘uma Ave Maria para livrar o Brasil do comunismo’”. Já a revista Fórum, em reportagem postada na quinta-feira (21), destaca que o padre sempre posou de moralista e agiu como um fascista. “Durante a campanha eleitoral, que antecedeu as eleições de 2018, ele divulgou um vídeo no qual pede votos para Jair Bolsonaro, por ser ‘o único candidato que combate o comunismo e é contra a ideologia de gênero e a política LGBT’. Antes disso, em 2016, Sousa escreveu um ‘artigo’, cujo título é ‘Cristãos contra o golpe do PT’. Em um trecho, ele diz: ‘É preciso reagir com energia. E além de rezar (melhor seria o exorcismo), temos que protestar nas ruas e na internet. Devemos utilizar de todos os meios legítimos para retirar Dilma, Lula, o PT e todos os que cometeram ilícitos’”.
O ex-padre também era admirador do ex-juiz e hoje superministro do laranjal de Jair Bolsonaro. “O juiz federal Sergio Moro, juntamente com o Ministério Público Federal e a Polícia Federal, têm feito excelente trabalho para desbaratar toda essa organização criminosa composta por empresários, doleiros, políticos e outros que, liderados pelo PT, se apropriaram do Estado brasileiro para se enriquecerem e sobretudo manter um projeto de poder”. O deputado Eduardo Bolsonaro, do Partido Só de Laranjas (PSL), inclusive acompanhava a militância virtual do falso religioso. Recentemente, ele replicou um Twitter do estuprador e postou: “Padre Rodrigo Maria denuncia a invasão socialista na igreja – já notável na CNBB – fato que vai contra os princípios da própria igreja católica”.
*Jornalista e presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itaráré