Bolsonaro, expoente e líder da extrema direita neoliberal, afirmou em mais de uma ocasião que não se deve pautar a orientação da política externa pela ideologia ao criticar a aproximação do Brasil de países como a China, o Brics, assim como a ênfase no comércio Sul/Sul, a defesa do Mercosul e o apoio à integração soberana dos países latino-americanos e caribenhos que caracterizaram os governos Lula e Dilma.
Mas, falso como uma nota de 3 reais, ele ameaça pautar o relacionamento do Brasil com o mundo por critérios puramente ideológicos – o que, diga-se de passagem, não foi o caso dos governos liderados pelo PT ou da política do Itamaraty sob o comando de Celso Amorin, que também serviu ao governo Itamar. O novo presidente é guiado por uma ideologia dogmática alicerçada num feroz anticomunismo e no fundamentalismo do mercado.
Preconceitos e ignorância
Movido por preconceitos de toda ordem e pela confessada ignorância das leis que regulam a economia, que têm caráter objetivo, o falastrão fascista andou cometendo inúmeras declarações infelizes contra a China e prometeu lealdade absoluta ao presidente Donaldo Trump, além de prestar uma bizarra e abjeta continência à bandeira dos EUA em Miami.
Mereceu, primeiro, uma reprimenda de Fábio Schvartsman, presidente da Vale, que tem na potência asiática o maior mercado para exportação de minérios extraídos pela empresa. Ele lembrou que os dois países desenvolveram uma “dependência mútua” e que um eventual conflito econômico e político “não é bom para ninguém”.
Depois, foi Pequim quem manifestou em termos duros sua indignação. O recado foi transmitido em editorial do principal jornal estatal com versão em inglês, o China Daily. O texto ressalta que criticar ou hostilizar a China (como Bolsonaro fez recorrentemente durante a campanha, inclusive visitando Taiwan) “pode servir para algum objetivo político específico”, mas “o custo econômico pode ser duro para a economia brasileira, que acaba de sair da pior recessão de sua história”.
Abraço de afogados
O jornal tem razão. Ao longo dos últimos anos a China se transformou na maior economia do mundo, suplantando os EUA, que há décadas amargam um processo de decadência histórica. Isto é um fato global, perceptível na Ásia, na Europa, na África, assim como no continente americano.
No Brasil não é diferente. Já em 2009 o gigante asiático transformou-se no nosso principal parceiro comercial, deslocando os EUA, tornando-se hoje, como lembrou o China Daily, “o maior mercado” para as exportações brasileiras “e primeira fonte do (nosso) superávit comercial”.
No rastro do comércio e como resultado das reservas e dos lucros (superávits) acumulados no comércio e em conta corrente a China galgou a posição de maior provedor dos investimentos externos verificados nos últimos anos no Brasil. Isto é verdade também para a maioria da América Latina, África e Ásia.
Com seus alicerces abalados pelo desenvolvimento desigual, a velha ordem internacional construída em Bretton Woods caducou e o mundo vive hoje um conturbado processo de transição para um novo arranjo internacional, cujos principais protagonistas, goste-se ou não, são a China e o Brics. O alinhamento com Donald Trump e a submissão canina ao imperialismo neste momento histórico, sob a bandeira do fanatismo anticomunista e do neofascismo, é mais do que irracional, é um abraço de afogados. O Brasil não merece isto.
Umberto Martins é jornalista, assessor da presidência da CTB e autor de O golpe do capital contra o trabalho
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