Para quem assistiu a primeira temporada da série Handmaid´s Tale – O Conto da Aia – baseada no livro homônimo da escritora canadense Margaret Atwood, o mundo distópico – no qual se passa a história – parece bastante distante. No enredo, as taxas de fertilidade caem drasticamente, uma guerra civil assola os Estados Unidos e um governo totalitário e militarizado assume o poder, fundamentado em uma teocracia cristã. Nesta nova conformação, as mulheres são completamente subjugadas. Aquelas que são férteis tornam-se prisioneiras e são designadas para engravidar de seus “donos”. Perdem sua identidade, são chamadas de “servas” e não têm permissão para trabalhar, possuir propriedades, controlar seu dinheiro ou até mesmo ler.
Num primeiro momento, a perturbação provocada pela violência da história é grande, entretanto é preciso refletir se estamos mesmo distantes do mundo criado pela autora.
As demonstrações públicas de assédio na Rússia, escancaram o machismo e a misoginia. Homens que assediam e humilham mulheres reduzindo-as basicamente a uma genitália, pipocam em vídeos na internet. O caso dos brasileiros que enganaram uma mulher russa, a induzindo repetir uma expressão ofensiva e de baixíssimo calão causou – por enquanto – somente a demissão de um funcionário da Latam, por violação ao código de ética da corporação. Frise-se que todos os homens identificados no vídeo são “letrados”, pelo menos do ponto de vista acadêmico.
Nesta copa, as jornalistas são a face mais visível da violência, pois são gravadas. Não conseguem simplesmente exercer sua profissão, trabalhar com dignidade sem ter de se esquivar de beijos ou até mais, como o caso de uma jornalista colombiana que – além de ser beijada sem permissão por um russo – ainda teve seu seio apalpado pelo assediador. Fica difícil até de pensar no caso de outras trabalhadoras que não tem similar visibilidade.
E estes episódios não se tratam de um escorregão moral ou porque esses homens estão do outro lado planeta, em festa e cheios de bebida. Estas atitudes são reflexo sim de uma sociedade machista que não respeita as mulheres e as enxerga como uma genitália ou uma “coisa” mesmo.
Se há um solitário ponto positivo nestes acontecimentos é o fato de que pelo menos se discutiu um pouco a questão, as empresas de comunicação emitiram notas em defesa de suas trabalhadoras. Mas isto é muito pouco. A consequência para os criminosos tem de ser severa, para que o mundo imaginado pela escritora Margaret Atwood continue apenas na ficção.
Cristiane Oliveira é secretária-executiva, pós-graduanda em Direito e Processo do Trabalho, assessora da Secretaria-Geral da CTB.
Os artigos publicados na seção “Opinião Classista” não refletem necessariamente a opinião da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) e são de responsabilidade de cada autor.