Como pai de uma criança e de um adolescente, doeu-me fundo ver crianças enjauladas e separadas dos familiares nos Estados Unidos, em fotos que chocaram o mundo. Apenas nas últimas seis semanas, já são mais de dois mil menores que foram colocados nesta situação.
O governo ianque informou à autoridades do nosso país que pelo menos 49 delas são brasileiras. São vítimas da política de “tolerância zero” da administração de Donald Trump, que a partir de abril passou a processar criminalmente os estrangeiros pelo crime de travessia ilegal, enviando-os a presídios federais.
A punição às crianças que os acompanham é ficarem enjauladas em abrigos improvisados, geralmente a centenas de quilômetros de onde estão presos os familiares. Na verdade, a política migratória norte-americana já deixou o estágio da “tolerância zero” para um grau de xenofobia institucional alarmante.
A atitude do governo norte-americano tem sido criticada internamente e no mundo todo. O Partido Democrata uniu-se em torno de um projeto de lei para proibir a separação de famílias. Dentro do próprio partido republicano, alguns políticos já se movimentam contra os excessos do seu correligionário presidente. O Papa Francisco fez uma crítica pública à medida e a Organização das Nações Unidas (ONU) voltou a pedir que seja interrompido imediatamente a separação das crianças dos seus familiares.
Mesmo com a pressão, Trump resiste e ameaça ser ainda mais severo com os imigrantes que tentam entrar no país. Alega que a culpa é dos seus opositores, que no Congresso estão impedindo a construção do prometido muro que vai separar os Estados Unidos do México.
O presidente quer seguir o exemplo de outro governo xenófobo, o seu aliado Israel, que construiu um muro para segregar os vizinhos palestinos. Considerado ilegal desde 2004 pelo Tribunal Internacional, aquele que também é qualificado como Muro da Vergonha, impõe severas restrições aos palestinos que ficam impedidos de circular ou trabalhar se não tiverem autorização das autoridades israelitas.
A política sionista do governo de Israel, que tem no muro mais uma expressão, foi revigorada pela ascensão de Trump, que pratica atos irresponsáveis, como transferir a embaixada americana para Jerusalém.
E o para que não nutramos nenhuma esperança de mudança de rota, nessa terça-feira (19), o presidente americano anunciou a retirada do seu país de mais um fórum multilateral. Desta vez, o importante Conselho de Direitos Humanos da ONU, no qual os americanos haviam integrado desde 2009, sob a gestão de Barack Obama.
Foi uma resposta tacanha à crítica do órgão à separação das crianças dos familiares e, nas palavras da embaixadora norte-americana no CDH, Nikki Haley, à negativa de outros componentes em aceitar a realização de uma reforma no Conselho, proposta por seu país. Com a decisão, há de se esperar um recrudescimento das políticas de Trump, que já avisa ao mundo que não tem que prestar satisfação a ninguém.
Há alguns anos, quando começou a chamar a atenção o processo de globalização, chegou-se a ventilar que este seria um novo tempo de integração internacional. Que a nova revolução industrial, consequência dos avanços tecnológicos, possibilitaria uma superação das fronteiras de ordem econômica, social, cultural e política, reduzindo custos e modernizando os meios de transporte e comunicação entre países. Mas o que acontece é justamente o contrário. Nunca fomos tão separados e a segregação contra os povos aumenta a cada dia. Infelizmente, a realidade veio contradizer à esperança.
Wadson Ribeiro é ex-ouvidor-geral do Estado e presidente do PCdoB-MG. presidente estadual do PCdoB-MG
Artigo publicado originalmente no diário mineiro Hoje em Dia
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