Embora o tema seja altamente atual, visto a grande dificuldade que mulheres enfrentam na busca de um emprego de qualidade de forma geral, devemos entender que a trajetória histórica da inserção ao mundo do trabalho para mulheres sempre caminhou para a exclusão ou diminuição da participação no trabalho no tocante ao valor deste.
Digo isso, porque historicamente, o mundo do trabalho sempre teve participação ativa das mulheres, que, por serem membros efetivamente ativos da sociedade nunca puderam se abster do trabalho. Desde o trato com a lavoura, fonte fundamental do sustento da humanidade, ou do trato com filhos, trabalho delegado pela burguesia às mulheres.
Á medida que as classes sociais foram surgindo, ocorreu a separação de mulheres das classes dominantes que foram excluídas deste processo e passou-se à utilização do trabalho das mulheres pobres.
Às mulheres negras o legado ainda é mais árduo. Durante a escravidão o trabalho desempenhado entre homens e mulheres nunca foi diferenciado, tendo elas que produzir resultados iguais aos homens para serem consideradas boas trabalhadoras e escapar dos castigos físicos. Mas por outro lado, não escapavam dos castigos sexuais que ao serem coisificadas pelo sistema escravista e por aqueles que compactuavam com tal situação, eram usadas como provedoras de prazer.
No cenário histórico que se construiu ao longo de séculos de exploração do trabalho escravo, quando do advento da Libertação dos Escravos a tentativa insípida de industrialização privada no Brasil, expulsa com furor a população oriunda da escravidão. Esmagadora maioria e também metade dela feminina, essas mulheres trabalharam em empregos relacionados ao trato doméstico na maioria das vezes. A indústria aceitou o trabalho de mulheres brancas e não negras.
Isso não quer dizer que elas desempenhavam trabalho diferente dos homens e em detrimento disso recebiam piores salários. O discurso reforçava que o salário delas apenas servia para complementação do salário dos maridos e que, por isso, não precisava ser igual.
O trabalho para mulheres brancas ainda é um obstáculo nos dias atuais. O trabalho de mulheres negras não se compara. Se levarmos em conta que a maioria da população feminina é descendente de escravas e que ao serem libertas permaneceram no submundo do emprego, a elas foi legado o serviço doméstico em casas de família de classe média e alta – vide que o aparato legal do trabalho de empregadas domésticas recebeu atenção somente em 2016/2017, acompanha-se o tamanho do atraso que ainda se enfrenta – os empregos informais de forma geral, ou se registradas, escondidas na limpeza de empresas.
Como professora há 15 anos, discurso aos alunos da escola pública que não há problema em nenhum tipo de trabalho, desde que possamos escolher aquilo que queremos fazer. O problema, é que nos moldes de educação implantado no país desde tempos imperiais, o trabalho considerado rentável não está disponível à classe desfavorecida economicamente que, assim permanece reproduzindo padrões sociais que atendem ao interesse do capital financeiro.
Neste universo, as mulheres carregam padrões estabelecidos por uma sociedade capitalista de exploração retirando direitos, impedindo acesso à educação – ainda assim mulheres brancas atingiram grau de formação maior do que a dos homens – e saúde de qualidade – onde a mortalidade de mulheres negras é assustadora –, por uma sociedade machista que tem interesses claros em retirar das mulheres autonomia social.
Embora os desafios sejam gigantes, creio que as mulheres hoje conseguem desempenhar papel mais protagonista do que jamais foi visto. Portanto, não é um movimento que possa ser desconsiderado ou mesmo apagado da História como muitas vezes aconteceu. Não há volta. Conheço muitas mulheres trabalhadoras, considerando trabalho todo produto humano, que com toda força se agarram a seus direitos. Escuto suas vozes todos os dias!
Lidiane Gomes é secretária da Igualdade Racial da CTB-SP.
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