Enquanto deputados defendem atualização da legislação para criminalizar esse tipo de discurso, entidades afirmam que criar novos tipos penais não resolve problema. Em 11 anos, 88 mil páginas foram removidas por incitarem o ódio e a violência na rede
Nesta terça-feira (28), participantes de comissão geral no Plenário da Câmara sobre a intolerância, o ódio, o preconceito e a violência por meio da internet discordaram sobre a melhor forma de coibir esse fenômeno.
O deputado Assis Melo (PCdoB-RS), autor do requerimento para discutir o assunto, acredita que a legislação atual é insuficiente para coibir esse tipo de discurso. “O papel do Congresso Nacional é especificar e tornar crime os atos de intolerância, ódio e preconceito que são disseminados, principalmente, através das redes sociais”, disse.
Segundo ele, o brasileiro é visto como cordial, mas “cotidianamente, se assiste, por meio das redes sociais, a difamações, calunias e violações contra pessoas em decorrência de sua aparência, gênero, condição social, descendência, origem nacional ou étnica, idade ou condição de pessoas com deficiência.”
Em discurso lido no Plenário, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, também defendeu a adaptação da legislação à nova realidade. “O arcabouço jurídico brasileiro mostra-se ineficaz para tratar essa questão”, salientou Maia. “O Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14) está precocemente envelhecido”, completou.
A coordenadora Geral do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, Renata Mielli, e a diretora do Coletivo Intervozes, Helena Martins, acreditam que a criação de novos tipos penais e o aumento de penas não é o melhor caminho. Conforme elas, já há leis aprovadas que punem discursos de ódio, como a Lei do Racismo (7.716/89) e a Lei Maria da Penha (11.340/06), mas, segundo elas, “a lógica punitivista” não tem contribuído para evitar os crimes. Para as debatedoras, a formação e educação para uso das redes é o caminho mais adequado.
Liberdade de expressão
Renata Mielli também criticou a possibilidade de mudança no Marco Civil da Internet para que provedores sejam obrigados a retirar sumariamente os conteúdos considerados ofensivos pelos ofendidos, sob pena de serem penalizados, como preveem alguns projetos em tramitação no Congresso. Ela acredita que esse caminho traz riscos para a democracia, podendo levar à censura e ao atentado à liberdade de expressão.
Ela defendeu a redação atual do Marco Civil da Internet, que não responsabiliza o provedor por conteúdos de terceiros. “Ele só passa a ser responsável caso não siga a determinação da Justiça de retirá-los”, explicou. Para ela, o Marco Civil não é uma lei envelhecida, mas é atual e importante, ao definir direitos e deveres do usuário de internet.
Páginas removidas
O presidente da SaferNet, entidade que recebe denúncias de crimes e violações na internet, Thiago Tavares, afirmou que o Marco Civil da Internet não cria obstáculos para a remoção de discursos de ódio.
“Nos últimos 11 anos, foram removidas voluntariamente pelas plataformas e pelas redes sociais 88 mil páginas, que foram denunciadas por incitarem o ódio e a violências na rede”, disse. Destas, conforme ele, 27,1 mil páginas foram removidas por conterem indícios de racismo; 26 mil, por incitação a crimes contra a vida; 13,2 mil por homofobia; 11,8 mil por xenofobia; 6,5 mil por indícios de neonazismo; e 2,8 mil páginas foram removidas por intolerância religiosa.
Tavares ressaltou que o trabalho vem sendo feito pelas plataformas sem ordem judicial, justamente porque essas páginas violam as leis já existentes e os termos de uso das plataformas. Para ele, sociedade brasileira é marcada pela violência, especialmente contra jovens negros e minorias, e essa violência não foi gerada pela internet.
O deputado Thiago Peixoto (PSD-GO) também concorda que a origem do problema não é tecnológica. Para ele, a violência, a intolerância e o ódio são fenômeno nacional e mundial, ao qual a internet dá escala. Já Maria do Rosário (PT-RS) destacou que o princípio da liberdade de expressão está assegurado na Constituição, mas que esta veda o anonimato, e isso tem que ser observado pelo Parlamento ao legislar sobre a questão.
Lara Haje é jornalista da Agência Câmara e da Rádio Câmara.
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