Este é o mês em que se levanta a bandeira da resistência para a emancipação de uma população que lutou quase que sozinho pela sua libertação, contrariando o lado burguês da história do Brasil, cuja afirmação da abolição da escravatura circula em torno de uma concessão da coroa brasileira.
A percepção das negras e negros devem ultrapassar a barreira da mente. A consciência negra é além de física, espiritual e deve desacorrentar a alienação do ‘não ser’. Consciência que gira na auto-afirmação e do auto-reconhecimento de cada um de nós, tendo um valor histórico que vai de encontro a toda ideologia que nos foi empurrada goela abaixo durante 500 anos de um país que embora vivamos, ainda não vivemos no etnocentrismo que não nos pertence porque a nossa cultura, a nossa religião, os nossos traços faciais nos são negados como um crime irreparável de existirmos e sermos negras ou pretos…
Revolucionar a maneira de fazermos ações particulares e coletivas é armar de seu lugar de direito o suficiente para reconhecer as correntes sociais que os aprisionam, para identificar a cara do inimigo e opressor e assim atacá-lo lado a lado.
Reconhecer que ser negro não é só tomar consciência de sua existência e colocação racial na sociedade para lutar contra o racismo, é perceber que existimos a partir de uma cultura que nos foi proibida de reivindicar enquanto nossa e sair de um papel de absolver apenas o que não nos contempla como sujeitos protagonistas de nossas histórias linda e rica durante os 365 dias do ano, nas vielas de corpos sem vida no chão, de mulheres donas de casa que suportaram a perda de seus filhos, nos jovens que saem às ruas gritando por seus direitos, naqueles que ocupam cada vez mais as universidades ou politizam a periferia e favelas. Lutando por suas demandas, o seu reconhecimento profissional, a valorização financeira do seu trabalho e o seu direito à vida continuam sendo cerceados. E o são também pelos “homens brancos” que, por razões históricas, controlam o poder econômico, político, religioso e midiático de nosso país.
Para mudar a realidade e torna-se cidadão de igual valor e não de segunda classe como quer a elite burguesa e também comemorar, não para contrapor uma data a outra, os heróis não negros aos heróis negros, mas porque é necessário tomarmos consciência da história que está nessa data, que traz elementos da nossa identidade.
O Brasil teve o período escravocrata mais longo da historia mundial – quase quatro séculos -, que trouxe como consequência a desigualdade que tem cor, nome e história. Esse não é um problema das negras e negros no Brasil, mas sim um problema do Brasil.
Cláudia Vitalino é dirigente da CTB-RJ, secretária-geral da Unegro Brasil e integrante da Comissão estadual da verdade da escravidão negra do Rio de Janeiro.
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