Dois fatos, duas notícias no dia 20 de outubro, não me deixaram dormir. O primeiro aconteceu em Goiânia, onde um jovem portando uma arma mata e fere colegas de classe. O outro, em Juiz de Fora, onde um pai faz uma denúncia ao Conselho Tutelar porque seu filho leva para casa uma boneca de pano para ser cuidada, seguindo um projeto pedagógico que visa desenvolver hábitos de zelo com o ser humano, concretizando a frase: “Quem ama cuida”. O pai não admite que o filho cuide da boneca, que representaria um bebê.
Arma para meninos e boneca para meninas. Seria isso? A lógica é essa? Seria esse o comportamento “normal” defendido pelas “tradicionais famílias brasileiras”? Ou toda família deveria ter orgulho em ver seus filhos e suas filhas desenvolvendo ações que reforçam o carinho, o amor, a solidariedade, a justiça e os cuidados humanos indispensáveis para a vida? Será que aquele pai que ficou indignado ao ver que seu filho cresce sabendo que os homens também cuidam e amam, e que filhos e filhas precisam ser amados e cuidados por pais e mães, gostaria de vê-lo levando uma arma para casa? Será que o jovem que usou a arma para matar, se tivesse tido a oportunidade de participar de projetos que ensinam a amar, teria praticado tanto desamor?
Essas questões e esses pensamentos me tiraram o sono e os sonhos. E devem mesmo nos tirar o sono e ser fruto de reflexões e debates, porque ficar acordado para a vida contra qualquer situação que naturalize o ódio, o preconceito, a discriminação, as injustiças e os retrocessos civilizatórios e sociais é urgente e indispensável. No entanto, não podemos abandonar os sonhos e a certeza de que a perspectiva de mudança nos move e que a construção de um mundo justo, fraterno e feliz deixa de ser sonho quando nos organizamos e nos unimos. Sonho que se sonha só é só sonho que se sonha só; sonho que se sonha junto é começo de realidade.
Cristina Castro é professora e diretora da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee)
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