As crises do capitalismo decorrem de contradições inerentes ao sistema. São, por definição, perturbações cíclicas do capital provocadas pelos próprios capitalistas. Todavia, quem mais sofre seus efeitos são os trabalhadores e trabalhadoras. Recente estudo da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas) comprova esta verdade ao indicar que 60% das negociações salariais foram concluídas em março com reajustes inferiores à inflação acumulada nos 12 meses anteriores (11,1%), o que significa rebaixamento dos salários reais.
O primeiro trimestre foi marcado pelo arrocho. Em média os acordos e convenções coletivas homologados no período consagram queda de 0,8% em janeiro, 0,3% em fevereiro e 0,1% em março. Dois fatores foram determinantes para este resultado: o crescimento do desemprego e a inflação também em alta, que tem o dom de corroer diariamente o poder de compra dos salários, operando uma perversa e furtiva transferência de renda do trabalho para o capital.
As estatísticas da fundação revelam ainda que o número de negociações coletivas concluídas com redução da jornada e redução dos salários subiu a 92 nos três primeiros meses deste ano, cerca de 35% do total computado nos 12 meses do ano passado. É outra consequência da crise, que deixa os sindicatos fragilizados e propensos a engolir sapos, fechando acordos que, em outras circunstâncias, seriam considerados inaceitáveis.
A redução da jornada sem redução de salários, além de conter o desemprego, teria outros reflexos positivos sobre a macroeconomia, uma vez que a preservação do poder de compra dos trabalhadores evitaria a contração do consumo, dificultando a transmissão da recessão para o setor de comércio e serviços. A contrapartida, neste caso, seria a redução dos lucros, coisa com a qual o patronato não concorda e as categorias, fragilizadas pelo desemprego, não têm força para impor. O capital não mede esforço para impor à classe trabalhadora o ônus da crise que ele próprio engendra.
A OIT (Organização Internacional do Trabalho) estima que até o final deste ano o exército de desocupados terá um acréscimo de 700 mil novas pessoas por aqui. Trata-se de um flagelo para milhões de seres humanos, que não castiga apenas os pobres e despossuídos do Brasil. A OIT prevê que o desemprego mundial, que não para de crescer e afetava 197,1 milhões no ano passado (cerca de um milhão a mais do que em 2014 e 27 milhões a mais do que nos anos anteriores à crise iniciada no final de 2007) deve ultrapassar a casa dos 200 milhões pela primeira vez em 2017.
Por estas e outras razões faz todo o sentido que a classe trabalhadora e o movimento sindical lutem também pelo desenvolvimento e defendam políticas públicas que promovem o crescimento econômico e a valorização do trabalho. Mas é preciso ter consciência de que as crises são inevitáveis sob o capitalismo e, além disto, o sistema de produção liderado pela burguesia, na medida em que amadurece, torna-se a cada dia mais hostil ao desenvolvimento das forças produtivas. Para solucionar o dilema será preciso superar o capitalismo e abrir caminho ao socialismo, o que de resto (a julgar pela história) não se faz sem revolução.
Umberto Martins é jornalista e assessor da CTB
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