Mais uma vez, vamos enfrentar um gravíssimo problema: estamos às voltas com uma nova Reforma da Previdência. Desde 1995, esse assunto foi apresentado diversas vezes, resultando em retirada de direitos dos trabalhadores.
Em 98, o Congresso Nacional aprovou a Emenda Constitucional 20, que atingiu os trabalhadores da iniciativa privada (INSS). Na ocasião, FHC (que chamou os aposentados de vagabundos) endureceu as condições de acesso aos benefícios e impôs maiores sacrifícios aos trabalhadores ativos. Dentro do saco de maldades daquela reforma, estava a substituição do tempo de serviço por tempo de contribuição, a extinção das aposentadorias proporcionais e a exigência de idade mínima (48 anos para mulheres e 53 anos para homens). O pior efeito veio com a introdução do complicado Fator Previdenciário, que baixou os valores dos benefícios. E mais: os salários de referência foram defasados em relação ao salário mínimo, reduzindo bruscamente o teto dos benefícios.
No início do governo Lula, em 2003, os meios de comunicação alardearam novamente a quebra da Previdência, mirando, dessa vez, os trabalhadores do setor público, acusados de “privilegiados”. A proposta enviada ao Congresso atingiu os servidores com corte de benefícios e mudanças de regras. Aí se estabeleceu a cobrança dos inativos (acima de R$ 1.058,00) em 11%, a redução das futuras pensões (que só poderiam atingir até 70% de seu valor) e o aumento da idade mínima de aposentadoria para os servidores (60 anos para os homens e 55 para as mulheres).
É sempre a mesma cantilena, repetida insistentemente pela mídia: o “rombo” do Regimento Geral de Previdência Social (INSS), o “déficit” no Regime Próprio dos Servidores Públicos (RPSP). Na realidade, os gastos com aposentadorias, pensões e outros benefícios dos trabalhadores com carteira assinada, somados a todas as despesas públicas com Saúde e Assistência Social, são cobertos de forma superavitária com contribuições recolhidas sobre o faturamento e o lucro das empresas (COFINS, CSLL), a CPMF, loterias e as contribuições dos trabalhadores e da patronal, formando o orçamento da Seguridade Social. Nessa conta, prevista na Constituição Federal, sobram R$ 53,9 bilhões (dado de 2014, segundo a ANFIP) – esse superávit vai para o Tesouro Nacional.
Manter a Previdência forte e sustentável, da forma como ela se apresenta hoje, é um desafio que demanda crescimento econômico no país. Além disso, é preciso atacar o desemprego e a informalidade no trabalho, cobrar dívidas das empresas e governos (estimadas em R$153 bilhões) e acabar com as isenções de entidades “filantrópicas” (faculdades particulares e clubes de futebol, por exemplo) – esse último caso é responsável, sozinho, pelo escoamento de R$ 12 bilhões por ano, se contabilizarmos também as desonerações de folha de pagamento concedidas pelo governo.
Fica claro, pela complexidade do tema, pelo impacto na vida de milhões de brasileiros e pela ameaça à qualidade dos serviços públicos, que uma Reforma da Previdência não pode ser feita com pressa e açodamento. Mais do que isso, nosso governo não pode aceitar as pressões do capital financeiro e das multinacionais por mais ajuste fiscal, cortando direitos dos servidores, nem pela criação de Fundos de Pensão para os futuros servidores, que representará na prática um aumento na transferência de recursos para o mercado financeiro, sem nenhuma garantia de que a especulação não devorará suas aposentadorias.
Paralelamente, não se pode aceitar as pressões que vêm dos governadores para fazer uma Reforma Tributária via Reforma da Previdência. Enquanto grandes empresários, banqueiros e latifundiários exigem sacrifícios dos servidores e batem bumbo por uma reforma nesses moldes, sonegam impostos e são beneficiados com isenções e renunciais fiscais – daí a importância de fazermos, primeiro, uma Reforma Tributária que taxe as grandes fortunas.
A CTB reafirma o seu entendimento de que essa Reforma da Previdência não interessa ao povo brasileiro, e só vai piorar a qualidade do atendimento. Ela não resolve o problema financeiro da Previdência, apenas atende aos interesses do capital financeiro que domina os meios de comunicação. A Reforma que interessa ao povo brasileiro não é para jogar pobres contra remediados ou trabalhadores do setor privado contra os do setor público. Devemos unificar os trabalhadores contra os ganhos fabulosos dos bancos e do setor financeiro, que inviabilizam o desenvolvimento econômico, a geração de empregos e a distribuição de renda.
Fundamentalmente, devemos refletir sobre o que é a contribuição previdenciária. Ela funciona como um seguro que os trabalhadores pagam ao longo da vida pelo “risco” de sobreviverem após seu período no mercado de trabalho. O benefício deveria ser calculado levando-se em conta o desenvolvimento econômico do país e o volume de renda gerado durante o período em que o trabalhador esteve na ativa. É um conceito social. Mas, para o pensamento neoliberal, a contribuição previdenciária deve ser um conceito de mercado, como se o trabalhador fosse um acionista de uma empresa.
A retomada do desenvolvimento é todo o ajuste que o Brasil precisa. Traçar um plano emergencial que retome o crescimento, que contemple novos investimentos em infraestrutura, que recupere nossa capacidade produtiva, e, com isso, gere emprego e renda – esse deve ser o redirecionamento da política econômica e do regime fiscal. A CTB propõe a mudança da atual política econômica conservadora, com redução dos juros e a retomada dos investimentos públicos e privados, que potencializam a produção industrial. E contra a propalada Reforma da Previdência.
Pascoal Carneiro é secretário de Previdência, Aposentados e Pensionistas da Central de Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).
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