Com o início da campanha dos 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, o debate sobre a situação de vida das mulheres vem à tona no movimento social e feminista. “O machismo é tão arraigado no país que a discussão sobre igualdade de gênero se torna uma das questões mais fundamentais para o avanço da democracia brasileira”, afirma Ivânia Pereira, secretária da Mulher Trabalhadora da CTB.
Neste ano, as mulheres saem às ruas também contra projetos em tramintação na Câmara dos Deputados que retrocedem nos seus direitos, tais como o Projeto de Lei 5069/15, do ainda presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que, para fugir das acusações de corrupção que pesam sobre si, põe na pauta projetos que prejudicam a vida da maioria da população.
“O movimento feminista reage à altura das agressões e denuncia esses projetos que retrocedem ao século 19, colocando as mulheres como figuras de adorno, destinadas a ficar somente no ambiente doméstico cuidando da casa e dos filhos”, argumenta Marilene Betros, secretária da Mulher da CTB-BA.
Internet do bem
Várias campanhas tomam conta da internet para denunciar abusos e o machismo inconsciente em muitos homens, que “não se julgam machistas”, diz Gicélia Bitencourt, secretária da Mulher da CTB-SP. Ela vê como positivas essas postagens “bem humoradas e por isso acabam obtendo boa repercussão no debate”.
Bastou uma menina de 12 anos aparecer no programa “MasterChef Júnior” na televisão, há algumas semanas, para choverem comentários pedófilos de tarados de plantão. Essa violência contra Valentina foi usada para a criação da hashtag #primeiroassedio (aqui) no twitter e outras redes sociais.
Uma enxurrada de denúncias foram sendo relatadas, como o caso a seguir. “Meu #primeiroassedio foi quando o marido da minha irmã, quando eu tinha uns 6 anos enfiou a mão na minha calcinha, ficou me tocando. Acho que foi por isso que me tornei agressiva, rude, tímida e muitas coisas mais”.
Para marcar o início da campanha dos 16 Dias de Ativismo pelo Fim da Violência contra a Mulher, outra hashtag. Por causa das festas de fim de ano e da tradicional brincadeira chamada amigo secreto, surgiram denúncias de incoerência e machismo velado em #meuamigosecreto.
Elas dizem que “#meuamigosecreto não tem vergonha de bater na namorada na frente da própria filha; mas tem vergonha de assumir que gosta de se relacionar com travesti”.
Ou “#meuamigosecreto já trabalhou comigo. Em posição de chefe, se achava no direito de apontar minhas roupas e decotes com comentários grotescos. Nunca respondi, pois estava começando e tinha medo de perder o emprego e não conseguir pagar as contas. Esse mesmo amigo era casado, mas dava em cima de todas as meninas na balada, mesmo com a esposa presente. Recentemente ele disse por aí que ‘mulher não gosta de pinto, gosta de conta bancária’”.
Internet do mal
A dirigente da CTB-ES Josandra Rupf afirma que as agressões sofridas pelas mulheres na internet, no entanto, também “são numerosas”. Ela cita o artigo do ex-blogueiro da revista Veja Rodrigo Constantino, em que ele diz que “muitas mulheres escolhem essa situação não pelos filhos ou pelos próprios parceiros, e sim pelo gozo que sentem na postura de vítima”. Para Josandra essa postura “é muito comum em homens que querem justificar a violência e a submissão das mulheres a todo custo”.
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Já Gicélia defende que “devem ser utilizados todos os meios possíveis para denunciar abusos e o comportamento machista secular, impregnado na sociedade”. Para ela, “a internet bem usada pode empoderar o debate em torno da igualdade de direitos, inclusive no mercado de trabalho”.
A campanha inspirou Bruna Sousa a criar uma página no Facebook (aqui) denominada Meu Amigo Secreto, que já conta com milhares de seguidores, de onde os relatos acima foram extraídos.
Os abusos são tantos que Catharina Doria, de apenas 17 anos, criou o aplicativo Sai Pra Lá, pelo qual as meninas podem denunciar as violências. A ideia de Catharina surgiu após o tema de redação do Enem deste ano “A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira”.
Inclusive trailer do documentário “O Olmo e a Gaivota”, codirigido por Petra Costa e pela dinamarquesa Lea Glob, critica com bom humor as atitudes machistas muito comuns no cotidiano dos brasileiros (assista abaixo).
As mulheres tomaram as ruas contra projetos que restringem seus direitos em tramitação na Câmara dos Deputados. Tais com o Estatuto da Família e o Projeto de Lei 5069/15, de Eduardo Cunha, que proíbe a pílula do dia seguinte. A “Primavera das Mulheres” já levou milhares às ruas.
Mônica Custódio, secretária de Promoção da Igualdade Racial da CTB, lembra que “as mulheres negras são as que mais sofrem preconceito por estarem em situação de maior vulnerabilidade social, com os menores salários e as piores condições de trabalho. E as que despontam na TV, por exemplo, com sucesso, são constantemente vítimas de agressões machistas e racistas nas redes sociais”.
Ivânia realça a importância de todos os projetos deesenvolvidos nos últimos 13 anos no combate à violência contra a mulher, mas afirma que “é preciso fazer muito mais”, porque “são quase 5 mil assassinatos de mulheres todos os anos pela simples razão de serem mulheres”. Diz ela que “isso tem que acabar” e cita a situação das trabalhadoras obrigadas
a trabalhar no dia seguinte “mesmo com o olho roxo, braço machucado ou seja como for”.
De acordo com a Secretaria de Políticas para as Mulheres, a violência contra a mulher vem aumentando. Houve aumento de 145,5% nos registros de cárcere privado; de 65,39% nos casos de estupro; e de 69,23% nos relatos de tráfico de pessoas no primeiro semestre de 2015 em relação a igual período do ano passado.
Marcos Aurélio Ruy – Portal CTB