Nós, que compomos o movimento sindical e as forças populares, no passado recente, e aqui demarco como referência o ano de 2002, tínhamos por definição ideológica e programática derrotar o modelo neoliberal instalado no Brasil, o que significava eleger Lula presidente da República. Essa unidade se repetiu em 2006 na sua reeleição e, em 2010, na continuidade do seu governo, por meio do apoio a Dilma Rousseff que também foi eleita.
Penso que, diferente dos períodos anteriores, o ano de 2014, também ano de copa do mundo e eleições, carrega particularidades que merecem uma reflexão, diria, um pouco mais apurada.
Para tanto, a seguir apresento alguns dados para a nossa reflexão:
I – Governo Lula e Governo Dilma
Toninho, do DIAP, em seu livro – “Movimento Sindical: Passado , Presente e Futuro”, de 2012, ao analisar o Governo Lula e Dilma nos informa que o governo Lula inaugurou novos paradigmas nas relações trabalhistas e sindicais com permanente diálogo, iniciando um importante processo de mudança cultural e uma fase de desenvolvimento econômico e social voltado para o mercado interno. No tocante ao governo Dilma, Toninho identifica o governo Dilma como de continuidade sem continuísmo e apresenta três características: 1. O acesso à presidente Dilma é raro e formal; 2. O governo, quando está no seu limite, não reabre diálogo ou negociação sobre temas de interesse dos trabalhadores e, 3. O governo além de não conceder reajustes aos servidores públicos em 2011, esvaziou o órgão encarregado das negociações com o funcionalismo.
Além disso, o Ministério do Trabalho e Emprego, principal interlocutor das centrais sindicais para temas do mundo do trabalho tem perdido espaço.
II – As escolhas da presidente: Desonerações
O segundo dado que trago à reflexão diz respeito às desonerações instituídas pelo governo federal no ano de 2013. Sabemos que desoneração é a redução da carga tributária, com consequente renúncia de arrecadação, o que, no limite significa retirar dinheiro das políticas sociais para presentear o mercado.
Sobre desoneração, no ano de 2013, foram expedidas 30 decretos; 15 Leis (Medidas Provisórias transformadas em Leis), além de meia dúzia de resoluções CAMEX. Segundo a Receita Federal, somente entre janeiro e outubro de 2013, as desonerações tributárias fizeram com que o governo deixasse de arrecadar R$ 64,350.
Atenção:
Para a companheirada ter uma ideia, este montante equivale a ir de Brasília a Tóquio, no Japão, cinco vezes, pisando em notas de cem reais! E ainda sobrando dinheiro.
De outro lado, só para exemplificar: o texto original da PEC 300 que estabelece o piso salarial para bombeiros e policiais militares, embora já aprovado em primeiro turno na Câmara não foi ainda pautado em segundo, por resistência do governo federal. O mesmo se aplica ao piso nacional dos Agentes de Saúde, entre outros.
III – Mensagem da presidenta: Mensagem ao Congresso Nacional para 2014
A terceira questão, e prometo ser a última, diz respeito à mensagem da presidenta ao Congresso Nacional.
Como é do conhecimento de todos, a cada ano os presidentes da República encaminham mensagem ao Congresso Nacional prestando contas àquela Casa e por consequência, ao povo brasileiro, do que realizou no ano anterior e, ao mesmo tempo, indicando o que realizará no ano corrente.
Olhando atentamente a Mensagem, pude verificar:
Na introdução da mensagem, duas informações, me chamaram a atenção: a primeira, diz: “Manteremos, em 2014, uma gestão das contas públicas compatível com a continuidade da política de profundo compromisso com a responsabilidade fiscal…”. Em outras palavras, arrocho. A segunda informação tem a ver com o agronegócio e a agricultura familiar: “Na safra 2013/2014 garantimos, mais uma vez, volumes expressivos para financiar a produção do agronegócio e da agricultura familiar. Para o agronegócio, são R$ 136 bilhões em crédito para custeio e investimento; para a agricultura familiar, são R$ 21 bilhões”. Atente ao montante que vai para o agronegócio e o que vai para a agricultura familiar.
Ao ler de maneira mais criteriosa a mensagem da presidente ao Congresso que tem 417 páginas, a mais longa da história do Brasil, identifiquei duas questões que destaco: 1. Para o item – agronegócio – foram dedicadas 17 páginas, de forma precisa, detalhada e estabelecendo metas, enquanto que, para o item – trabalho e emprego – foram dedicadas apenas 7 páginas de maneira diluída e superficial.
IV – O que fazer?
O cenário:
Ora, sabemos que todo governo fora de um processo revolucionário é por natureza conservador, pois é tarefa sua garantir a institucionalidade, o que implica ser o guardião da legalidade e, claro, o Brasil não foge à regra. E a presidente Dilma como representante maior, também não.
Uma olhadela rápida pelas outras centrais sindicais é possível identificar que a CUT pela sua ligação histórica e umbilical com PT, vai subalternizar-se ainda mais aos interesses do governo; a Força Sindical vai mover-se em função dos interesses do seu presidente, Paulinho e do partido por ele criado; A UGT, Nova Central e CGTB não têm densidade ideológica para protagonizar ações consistentes no cenário ora presente, e a CONLUTAS não tem capilaridade.
É neste cenário que estamos nos movimentando, e, é nele que precisamos ser revolucionários, o que significa, como dizia o poeta: “manter a mente esperta, a espinha ereta e o coração tranquilo”, para podermos avançar, atentos, firmes e sem ódios.
Nossa tarefa:
Sabemos que as leis são resultados das disputas que acontecem no interior da sociedade. Também sabemos, que os avanços dos direitos da classe trabalhadora tem uma relação direta com o grau de organização, a capacidade de elaboração, e na ação das instituições deles representantes. É com esta compreensão que nós da CTB temos a convicção que a nossa tarefa é extrair da sociedade aquilo que é legítimo e na disputa, dar a ele, o legítimo, um caráter legal, o que significa:
– Na luta, conquistar a jornada de trabalho de 40 horas semanais;
– Derrotar o fator previdenciário;
– Intervir, defender e garantir a agricultura familiar;
– Garantir como princípio a independência do movimento sindical.
Nós da CTB, não temos apenas 6 anos de história. A CTB acumula por meio de seus dirigentes a sabedoria de décadas de lutas. Lutas estas muitas vezes vitoriosas e outras nem tanto, mas todas servindo de alimento para avançarmos atentos, firmes e sem ódio.
Francisco das Chagas Firmino do Nascimento é secretário de Política Sindical e Relações Institucionais da CTB, economista e mestre em Políticas Públicas e Gestão da Educação pela Universidade de Brasília-UnB.
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