Após os três dias de debates realizados durante seu 3º Congresso Nacional, a CTB divulga a versão final de sua Resolução Política. Confira abaixo a íntegra do documento:
RESOLUÇÃO POLÍTICA DO 3º CONGRESSO NACIONAL DA CTB
1- O 3º Congresso da CTB realiza-se em meio aos impactos das jornadas populares de protesto iniciadas em junho deste ano, que em seu auge, no dia 20, mobilizaram mais de um milhão de pessoas. Emergiu das ruas um novo cenário político no Brasil.
2- As pesquisas sugerem que a maioria dos participantes eram jovens trabalhadores e estudantes, com elevado nível de escolaridade. Afluíram às ruas espontaneamente, à margem dos sindicatos, entidades estudantis e partidos políticos.
3- Com alto grau de espontaneísmo, o movimento da juventude evidenciou a existência de um massivo descontentamento com o sistema capitalista e uma crise de representatividade no País – que demanda maior reflexão crítica e autocrítica por parte do movimento sindical e das forças democráticas e progressistas. Foi também acompanhado de uma sensível queda na confiança da população em relação às instituições e ao sistema político.
4- A direita neoliberal e a extrema direita tentaram pegar carona nas manifestações, aproveitando a ausência de uma direção firme e uma pauta mais definida para imprimir-lhes um sentido golpista, visando o desgaste e a desestabilização do governo Dilma, dos partidos de esquerda, sindicatos e organizações sociais. Sobressaiu, também, a reação repressiva e truculenta da polícia, claramente repudiada pela população.
5- Na ação orquestrada da direita neoliberal cumpre destacar o comportamento da mídia burguesa, golpista e sempre muito hostil com os movimentos sociais, que inicialmente tomou posição contra as manifestações. Ao perceber a fragilidade das lideranças, mudou descaradamente de posição e, com um oportunismo desprezível, passou a apoiar e convocar os atos, incitando o povo contra os movimentos sindicais e os partidos de esquerda.
6- Nas ruas, provocadores de extrema direita atuaram de forma organizada agredindo militantes de centrais sindicais e partidos políticos, provocando arruaça e vandalismo. O objetivo das forças reacionárias é desgastar e desestabilizar o governo Dilma de forma a interromper o ciclo de mudanças iniciado em 2003 e abrir caminho ao retrocesso neoliberal em 2014 ou, quem sabe, ao golpe militar.
7- É preciso atentar para o contexto internacional de crise do capitalismo e de acirramento da luta política na América Latina, onde iniciativas golpistas foram observadas recentemente em vários países (Venezuela, Bolívia, Equador, Honduras e Paraguai), com apoio velado ou ostensivo do imperialismo estadunidense.
8- Os EUA conspiram diuturnamente contra os planos de integração latino-americana defendido pelos governos progressistas e não abriram mão do projeto de uma Área de Livre Comércio das Américas (Alca), que procuram implantar por outros meios, recorrendo a tratados bilaterais e à criação da chamada Aliança para o Pacífico (México, Colômbia, Chile e Peru), cujo objetivo mal disfarçado é inviabilizar o Mercosul.
9- O caráter imperialista da política de Washington se manifesta no desenvolvimento de um amplo programa de espionagem mundial, com base na internet e nas multinacionais que dominam o ramo (Google, Facebook, Microsoft, Yahoo!, Apple e MSN). O Big Brother global denunciado pelo jovem Edward Snowden fez do Brasil seu principal alvo. Soma-se a isto a reativação da 4ª Frota de Intervenção, instalação de novas bases militares na Colômbia, o constrangimento imposto ao presidente da Bolívia, Evo Morales, quando retornava de Moscou e outras ações hostis. A luta política nacional não está alheia ao contexto de crise econômica e geopolítica mundial e não pode ser bem compreendida isoladamente. Não podemos ignorar os riscos de retrocesso.
10- A ação das forças reacionárias não deve obscurecer o caráter objetivamente progressista dos protestos, que contaram com amplo apoio do povo e da CTB, resultaram na redução dos preços das passagens em várias cidades, aqueceram o debate político e influenciaram a agenda dos governos e do Congresso Nacional.
11- Apesar da pauta difusa, ficou claro que os manifestantes revelam aversão à mídia burguesa, reivindicam mais investimentos públicos em saúde, educação, segurança, transporte e mobilidade urbana, bem como combate à corrupção e reforma política. Pesquisas recentes do Ibope indicam que 85% das brasileiras (e brasileiros) defendem a reforma política, 78% são contra o financiamento das campanhas pelas empresas e uma expressiva maioria quer voto em lista e a presença de mais mulheres na política.
12- Combater a direita não significa renegar as ruas e a luta popular. As centrais, movimentos sociais, partidos e forças progressistas estão diante do desafio de disputar a consciência da juventude e do povo brasileiro, buscando unir o movimento espontâneo à luta consciente da classe trabalhadora por transformações sociais mais profundas, levando às ruas um programa claro para avançar nas mudanças aprofundando a democracia, contemplando as demandas do povo e valorizando o trabalho.
13- É preciso assinalar que o movimento sindical reagiu à conjuntura de forma unitária, em aliança com o conjunto dos movimentos sociais, realizando em 11 de julho uma grande manifestação nacional, com greve geral em várias cidades (como Salvador, Porto Alegre, Belo Horizonte e Vitória) e atos nas 27 unidades da federação. Foi uma intervenção organizada e consciente da classe trabalhadora, que agitou nas ruas suas bandeiras históricas (redução da jornada, reforma agrária, igualdade entre homens e mulheres, fim do fator previdenciário e valorização das aposentadorias, não à terceirização, Convenção 158) e as reivindicações mais sentidas do nosso povo por mais investimentos no SUS, bem como na educação, em transporte público e reforma política.
14- Longe de ser o fiasco propagado pela mídia, burguesa e golpista, o protesto sindical foi comemorado de forma unânime e corretamente avaliado pelas lideranças como um êxito e um passo na direção de mobilizações mais enérgicas e massivas. No dia 6 de agosto as centrais voltaram às ruas, liderando manifestações contra a terceirização frente a entidades patronais em várias capitais do país. Trabalha-se agora pela realização de um Dia Nacional de Lutas com Mobilizações e Paralisações em 30 de agosto pelo atendimento da Pauta Trabalhista.
15- O 3º Congresso da CTB orienta os sindicatos e entidades filiadas a ampliar a mobilização e conscientização das bases, debatendo a agenda da Conclat e dando atenção especial aos jovens trabalhadores, atraindo mentes e corações para a luta por um novo projeto nacional de desenvolvimento com valorização do trabalho, democracia e soberania. A voz das ruas clama por saúde pública, transporte público, educação pública em contraposição aos interesses e serviços privados. Em poucas palavras, o povo brasileiro quer mais Estado e menos mercado. A CTB reitera a luta contra as privatizações nos setores estratégicos para a nação.
16- A solidariedade e o internacionalismo classista são marcas do sindicalismo classista, cujos militantes e dirigentes devem mobilizar as bases para as manifestações do Dia Internacional de Luta convocado pela Federação Sindical Mundial (FSM) para 3 de outubro.
17- A nação demanda a realização urgente de reformas estruturais, uma Constituinte exclusiva, o plebiscito da reforma política, que deve ser orientada para reduzir a influência do poder econômico e da corrupção nas campanhas eleitorais e nas instituições, ampliar a participação das mulheres e das lideranças populares; a reforma tributária progressiva, com taxação das grandes fortunas e das remessas de lucros e redução do IRPF e dos impostos indiretos; reforma da mídia visando a democratização dos meios de comunicação e o combate ao monopólio exercido por meia dúzia de famílias capitalistas; reforma agrária e fortalecimento da agricultura familiar; reforma urbana; reforma educacional; reforma do Poder Judiciário. Cabe destacar também a necessidade de combater as desigualdades regionais e fortalecer o Pacto Federativo, hoje ameaçado pela centralização de recursos tributários na União e consequente enfraquecimento financeiro dos municípios e estados.
18- Vai ficando a cada dia mais claro que para contemplar os interesses populares é indispensável mudar a orientação econômica. A CTB reitera a crítica à política monetária comandada pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom), que anuncia novas elevações da Selic, apesar do recuo da inflação. Alerta, ao mesmo tempo, para a intensificação das pressões dos setores conservadores e da mídia pelo aprofundamento do arrocho fiscal, redução dos gastos públicos e mesmo o fim da política de valorização do salário mínimo a pretexto de combater a inflação.
19- Aliada ao câmbio flutuante e ao superávit fiscal primário, a atual política monetária serve apenas aos interesses da oligarquia financeira, traduz uma perversa transferência de dinheiro público para os rentistas, tem caráter recessivo e é um imenso obstáculo ao desenvolvimento nacional, melhoria dos serviços públicos e valorização do trabalho. É nosso dever continuar lutando e mobilizando a classe trabalhadora pela redução dos juros, o fim do superávit primário, o controle do câmbio e do fluxo de capitais, a taxação das remessas de lucros, a revisão das desonerações, a criação de um fundo de investimento público em educação, saúde, transporte e infraestrutura.
20- A economia brasileira precisa crescer a taxas mais robustas, superar os entraves que resultam na baixa taxa de investimentos internos e crescimento do PIB, reverter o processo de desnacionalização e desindustrialização, bem como o déficit em conta corrente e a crescente vulnerabilidade externa e dependência face ao capital estrangeiro.
21- Nossas demandas não serão atendidas sem muita luta, uma vez que colidem com os interesses da burguesia e da direita. É indispensável ampliar a unidade das forças progressistas. Neste sentido, a CTB propõe a instalação de um fórum nacional reunindo as centrais sindicais, os movimentos sociais e os partidos de esquerda com o objetivo de debater uma plataforma comum e realizar, em torno dela, atos unitários em todo o país, procurando ao mesmo tempo combater e desmascarar a direita e barrar o retrocesso neoliberal.
22- Nosso objetivo estratégico é concretizar a agenda da Conclat por um novo projeto nacional de desenvolvimento orientado por três valores fundamentais: valorização do trabalho, soberania e democracia.
A Pauta Trabalhista
Realizada pelas centrais sindicais (CTB, CUT, FS, NCST e CGTB) no dia 1º de junho de 2010 no estádio do Pacaembu em São Paulo, a Conferência Nacional da Classe Trabalhadora (Conclat) reuniu cerca de 30 mil sindicalistas e dotou o movimento sindical de um autêntico programa político ao aprovar a agenda da classe trabalhadora por um novo projeto nacional de desenvolvimento com valorização do trabalho, soberania e democracia.
É com base neste documento que as centrais elaboraram a Pauta Trabalhista que está sendo negociada com governos e empresários, foi levantada com força na manifestação de 11 de julho e deve servir de guia para a greve nacional que deve ser deflagrada pelas centrais sindicais caso as negociações não cheguem a bom termo.
A Pauta Trabalhista contempla bandeiras históricas da classe trabalhadora e são componentes essenciais do novo projeto de desenvolvimento das centrais. Compreende as seguintes reivindicações:
• Fim do Fator Previdenciário;
• Jornada de 40 horas semanais sem prejuízo para os salários;
• Fim do fator previdenciário e valorização das aposentadorias e pensões;
• Mais investimentos em saúde, educação, transporte, mobilidade urbana e segurança;
• Igualdade de oportunidade entre homens e mulheres
• Não ao Projeto de Lei 4330 que amplia a terceirização;
• Ratificação e regulamentação das convenções 158 e 151 da OIT;
• Reforma Agrária e fortalecimento da agricultura familiar;
• Fim dos leilões do petróleo;
• Democratização da mídia;
• Reforma política com financiamento público de campanha.
Desafios da CTB na nova conjuntura política
Na nova conjuntura política que brotou dos protestos populares iniciados em junho é necessário realçar alguns desafios do sindicalismo nacional, em especial da CTB, no atual momento histórico. Um contingente considerável dos manifestantes, senão a maioria, pertence ao que podemos considerar a moderna classe trabalhadora brasileira, pois nada menos do que 76% trabalham, segundo pesquisa do Ibope, 63% são jovens com até 29 anos, 52% estudam e 43% têm curso superior.
Esses trabalhadores e trabalhadoras não foram convocados nem se sentem representados pelos sindicatos, entidades estudantis ou partidos políticos. Isto evidencia a necessidade de aprofundar a inserção e organização das nossas entidades nas bases, de forma a envolver na ação sindical a juventude trabalhadora, os trabalhadores estudantes, as mulheres. O sindicalismo classista tem de estar sintonizado com as transformações ocorridas no mercado de trabalho brasileiro, que conferiram um novo perfil e novas características à nossa classe trabalhadora.
Os jovens, bem como as mulheres e os negros, são vítimas de forte discriminação nos países capitalistas, recebem salários mais baixos, estão mais expostos ao desemprego, terceirização e outras formas de precarização das relações trabalhistas. Não é de estranhar a inquietude e o descontentamento que invadiu as ruas.
Superar o divórcio entre essas bases e as direções sindicais e integrar esses segmentos da classe no movimento sindical é um desafio que deve ser considerado com seriedade e eleito como prioridade. Isto passa, em primeiro lugar, pela intensificação do trabalho nas bases. Requer contatos e consultas mais frequentes e permanentes, maior esforço de conscientização, comunicação e luta ideológica contra a influência deletéria da mídia neoliberal.
É igualmente necessário estimular a renovação nas direções dos sindicatos, ampliando a participação dos jovens, bem como mulheres e negros. Devemos trabalhar no objetivo de dotar a juventude trabalhadora e o movimento espontâneo das massas de uma consciência classista mais avançada, de forma a engrossar a luta pelo desenvolvimento com valorização do trabalho e pelo socialismo.
A experiência mostra que o movimento espontâneo das massas, sem uma consciência clara dos seus objetivos, uma pauta e um rumo definido, por si só não leva a lugar nenhum e está sujeito à manipulação da direita. Isto reforça a necessidade de ampliar a capacidade de mobilização das bases, que hoje deixa a desejar, organizar os trabalhadores e trabalhadoras nos locais de trabalho, intensificar o trabalho de formação classista das lideranças e qualificar a comunicação com as bases visando construir e elevar o nível da consciência da classe e de mobilização.
É preciso zelar pela unidade da classe trabalhadora e neste sentido a CTB propõe um funcionamento mais regular do fórum das centrais e a realização de uma Plenária Nacional Unitária do Movimento Sindical para debater a nova conjuntura política, instalar uma Mesa Permanente das Centrais e organizar a luta pela concretização da agenda da Conclat.
Merece especial atenção a participação dos sindicalistas classistas nas eleições de 2014, que deve ser orientada pelo objetivo de barrar o risco de retrocesso neoliberal, derrotando as forças conservadores e de direita e procurando eleger candidatos comprometidos com os interesses da nossa classe e o projeto de nação que defendemos.
Devemos atuar na batalha eleitoral com o objetivo de mudar a atual correlação de forças no Congresso Nacional, assim como nos legislativos estaduais, que é marcada pela hegemonia do capital e francamente desfavorável ao povo trabalhador, como demonstra o conflito em torno da terceirização. A mudança desta correlação de forças é o pressuposto para uma repactuação política progressista disposta a avançar nas mudanças com valorização do trabalho.