O Hospital Regional Norte, promessa de campanha ainda da primeira candidatura de Cid Gomes, em 2006, foi inaugurado com anos de atraso e direito a anúncio megalomaníaco, pegando carona no show da cantora baiana Ivete Sangalo. O cachê de R$ 650 mil ofende os mais ciosos com a coisa pública, bem como os usuários do SUS no Ceará.
Escândalo é uma boa palavra para o caso, tendo em vista que faltam leitos, remédios, materiais fundamentais de trabalho (profissionais da saúde são obrigados a conviver, diariamente, com a escolha ingrata de qual vida salvarão). Falta ainda dignidade para os profissionais da saúde que servirão à população em condições precárias de trabalho, pois não houve concurso público.
Assim como o Hospital Regional do Cariri, o recém-inaugurado Hospital Regional Norte é gerido pela organização social Instituto de Gestão Hospitalar. Na teoria, muito bonito, integração entre Estado e sociedade civil na gestão de áreas relevantes para a sociedade. Na prática, uma maneira de o Estado dispor de mão de obra barata, sem fazer concursos que garantam mínimas condições de trabalho aos profissionais, com critérios duvidosos de escolha das organizações sociais, cheirando a apadrinhamento. Em tempo: estamos vivenciando graves problemas em Fortaleza com a organização social IDGS. Não queremos o mesmo em nível estadual.
O que poderia ser feito em prol da saúde com o cachê de Ivete Sangalo? Mais leitos, que tanto faltam ao HGF e outros hospitais? Concurso público? Na última quarta-feira (30/1), os servidores de nível médio paralisaram as atividades nos setores fechados (centros cirúrgicos, emergências e UTIs) dos maiores hospitais do Estado por quatro horas. A categoria, depois de duas greves e muita luta pelo Plano de Cargos, Carreiras e Salários (PCCS), sofreu forte golpe do governo Cid Gomes: além de não ter conquistado o PCCS, teve drásticas reduções de gratificações pagas há muitos anos, o que implicou em redução salarial até R$ 300 – em um vencimento já muito baixo, esse valor teve impacto considerável. Sofrem trabalhadores e população, pois nova greve se anuncia para o mês de fevereiro.
A política de pão e circo, prática antiga, infelizmente ainda faz sucesso entre nossos gestores. Não basta construir um hospital, bonito, “para inglês ver”, fazendo estardalhaço em sua inauguração, com show de uma das cantoras mais famosas do Brasil. Paredes não curam ninguém. É preciso dotar o novo equipamento de vida, respeitando os profissionais da saúde e dando-lhes condições de trabalhar para o bem comum.
Marta Brandão é presidente do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos de Serviços de Saúde do Estado do Ceará. Artigo originalmente publicado em “O Povo”.