Na tarde da última sexta-feira (18), profissionais ligados à atividade jornalística se reuniram no Centro Cultural CEEE Érico Veríssimo, em Porto Alegre, para debater o tema “Violência Social Contra Jornalistas”: do Crime Organizado aos Detentores do Poder Localizado”, painel integrante do Seminário Internacional de Direitos Humanos e Jornalismo.
O Brasil ocupa o 5º lugar no ranking dos países mais perigosos para a atuação do jornalismo, índice revelado pelo Instituto Internacional de Imprensa. Com isto em mente, os palestrantes discorreram sobre a atual situação dos jornalistas no país e a herança violenta deixada pelas ditaduras militares, tanto no Brasil e no Uruguai, que ainda mantém crimes contra profissionais da mídia impunes.
O deputado federal Protógenes Queiroz (PCdoB) esteve presente na mesa para apresentar o projeto de lei de sua autoria que prevê a federalização da apuração dos crimes contra jornalistas quando houver omissão ou ineficiência das esferas locais. O PL 1078/2011 propõe que tais crimes sejam investigados pela Polícia Federal e julgados pela Justiça Federal para que não fiquem sujeitos à polícias locais, muitas vezes comprometida politicamente.
“O objetivo da PL é proteger a democracia. A atividade jornalística é uma segurança para o estado, o povo e convívio social”, explicou o deputado, que é delegado licenciado da Polícia Federal. Ele contou, porém, que o projeto não tem sido bem acolhido na Câmara. “Vejo parlamentares que são indiferentes à questão e outros que, inclusive, estão tentando fazer com que a tramitação do projeto não tenha sucesso”, afirmou.
“Há muito debate sobre censura e controle de mídia na Câmara dos Deputados atualmente, então tudo o que protege a liberdade de imprensa causa mitigação”, lamentou Queiroz. “Sempre há a tentativa de impedir que o projeto tenha uma tramitação rápida e urgente”.
O deputado lembrou a posição preocupante do Brasil na lista de países que cometem violência contra jornalistas e apresentou dados da Comissão de Proteção aos Jornalistas, que aponta que 11 profissionais foram assassinados em 2012. “E quantos casos existem que ainda não foram reconhecidos pela CPJ?”, questionou ele.
Queiroz também apontou os casos famosos de Vladmir Herzog, que foi assassinado pela ditadura militar em 1975, e Tim Lopes, morto por traficantes no Rio de Janeiro em 2002, como exemplos de omissão do estado. “Sabemos quem matou Herzog? Quem foram os comandantes, executores, políticos por trás do assassinato?”, perguntou. “E o caso do Tim Lopes só foi parcialmente resolvido, levando à prisão do traficante Elias Maluco, porque as organizações Globo colocaram sua própria infraestrutura para fazer a investigação”, afirmou.
O deputado alertou para o fato de que, durante períodos de maior atividade eleitoral, a vulnerabilidade dos jornalistas à violência aumenta, principalmente durante campanhas municipais. “Jornalistas em pequenos municípios do Norte e do Nordeste estão mais vulneráveis”, lamentou ele, afirmando que, nas eleições municipais de 2012, profissionais foram vítimas de violência. “As polícias locais não têm infraestrutura nem interesse para investigar os casos, e muitas vezes têm comprometimento político”, argumentou.
Para jornalista uruguaio, impunidade de ditadores impede consolidação da democracia
O jornalista uruguaio Roger Rodriguez ofereceu ao público um panorama da situação dos jornalistas de seu país durante a ditadura civil-militar, de 1973 a 1985. Ele lembrou que, desde 1968, jornalistas foram torturados, sequestrados e censurados pelo regime. “Escrever sobre as guerrilhas era proibido. Apenas mencionar o termo ‘tupamaro’ já era motivo de censura”, explicou.
“Eu sempre digo que vivemos o amor nos tempos de impunidade. Toda nossa sociedade é impune”, afirmou Rodriguez. “Se não punimos nem os crimes de lesa-humanidade cometidos contra nossos países, o que faremos hoje?”, questionou. O jornalista ainda lembrou o “modelo econômico imposto pela ditadura”, que criou uma nova série de impunidades.
O diretor de relações institucionais da Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) Sérgio Murillo também afirmou a necessidade de punir os torturadores e assassinos da ditadura como necessidade básica da manutenção das novas democracias latino-americanas. “A ditadura é muito recente, ainda está na pele de muita gente. A democracia não tem como se consolidar se não saldarmos essa dívida história com famílias e vítimas”, disse ele, que também é membro da Comissão de Memória, Verdade e Justiça dos Jornalistas Brasileiros.
Murillo também pontuou que é preciso que a classe jornalística olhe também para a própria atuação, tanto para as irregularidades cometidas atualmente, quanto para as do passado. “É preciso lembrar que o estado só conseguiu se manter no poder através do patronato e do apoio da grande mídia”, afirmou. “A Rede Globo, que acusa a FENAJ de autoritária por ser favorável a instituição do conselho de comunicação, cresceu e se tornou o monopólio que é durante a ditadura militar”.
Sobre o projeto de lei do deputado Protógenes Queiroz, Murillo afirmou que, além de proteger os jornalistas, é preciso uma regulamentação para que haja cobrança por uma prática mais ética da profissão. “Não temos mandato para ser juiz, nem promotor. Temos que refletir sobre os limites da nossa atuação”, afirmou.
Portal CTB com agências