A morte de Eric Hobsbawm priva o mundo de um de seus mais instigantes historiadores. Um de seus livros clássicos comparou as duas grandes revoluções da era moderna: a Revolução Francesa e a revolução industrial inglesa.
Os estudos sobre a revolução inglesa trouxeram luzes relevantes para entender a dinâmica do desenvolvimento. Como uma pequena ilha, com pouca população, sem autossuficiência em matérias primas, torna-se a mais relevante nação do planeta por quase duas décadas.
Hobsbawm definia “revolução industrial” como a criação de um “sistema fabril” mecanizado que por sua vez produz em quantidades tão grandes e a um custo tão rapidamente decrescente a ponto de não mais depender da demanda existente, mas de criar o seu próprio mercado *.
Qual o segredo do Império Britânico?
Dizia Hobsbawm: “Os franceses produziram inventos mais originais, como o tear de Jacquard (1804) – um aparelho mais complexo do que qualquer outro projetado na Grã-Bretanha – e melhores navios. Os alemães possuíam instituições de treinamento técnico, como a Bergakademie prussiana, que não tinham paralelo na Grã-Bretanha, e a Revolução Francesa criou um corpo único e impressionante, a Êcole Polytechnique. A educação inglesa era uma piada de mau gosto”.
O primeiro diferencial foi uma reforma capitalista no campo, que liberou mão-de-obra e poupança para investimentos na indústria.
Depois, foi montar uma política de Estado permanente para ampliar radicalmente o mercado externo, permitindo à indústria margens de lucro superiores às do comércio.
Com as Leis de Navegação, a Inglaterra garantiu para sua frota o transporte marítimo do seu comércio exterior. A partir daí, dominou o comércio do Atlântico e pode montar estratégias comerciais, diplomáticas e bélicas para assegurar mercados para seus produtos.
Com o produto da venda do algodão indiano, por exemplo, compravam-se escravos africanos. Os escravos eram arrebanhados nas plantações das Índias Ocidentais. De lá saia a maior parte do algodão para a indústria britânica. E o pagamento era em tecidos de algodão, adquiridos pelos plantadores.
Esse mesmo modelo foi aplicado na América. Depois da década de 1790, revela Hobsbawn, a demanda britânica por algodão garantiu a expansão das plantações escravagistas do sul dos Estados Unidos. E os plantadores demandavam o grosso da produção de algodão bruto britânico.
O acordo de Metuhen, com Portugal, permitiu à manufatura inglesa arrebentar com a portuguesa e, através dos superávits comerciais, raspar o caixa da Coroa, enriquecido pelo ouro brasileiro.
Foi essa vertiginosa expansão do comércio que forneceu o espaço para o empresariado alçar voo.
Entre 1750 e 1769, aumentou em mais de dez vezes a exportação britânica de tecidos. Empresários que saíam na frente eram recompensados de forma exponencial.
Com o apoio do governo nacional, a indústria britânica logrou monopolizar quase todos os setores industriais.
Os estudos de Hobsbawm completaram os de Friedrick List, do século 19, permitindo entender um pouco melhor a dinâmica do desenvolvimento.
Luis Nassif é jornalista. Texto originalmente publicado em seu blog.