É reconhecidamente lastimável o estado da saúde pública no Brasil, carente de recursos e investimentos. Mas a situação pode melhorar se o Congresso Nacional aprovar o Projeto de Lei Complementar (PLP) nº 48/2011, que cria a Contribuição Social sobre Grandes Fortunas (CSGF) com a promessa de um aporte adicional estimado em R$ 14 bilhões para o setor.
A proposta, em tramitação na Câmara Federal, é do deputado Dr. Aluízio (PV-RJ) e tem por relatora a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), que vinculou a destinação dos recursos à saúde. O objetivo é estabelecer uma contribuição compulsória dos ricaços “que será integralmente repassada ao Fundo Nacional da Saúde”, conforme determina o artigo 9º do PLP.
A taxação das grandes fortunas é uma demanda histórica dos movimentos sociais e desfruta de amplo apoio das forças democráticas e progressistas do país. A ideia foi contemplada pela Constituição Federal promulgada em 1988, mas depende de lei complementar para se transformar em realidade. Como contraria interesses dos mais ricos e poderosos, em geral grandes financiadores de campanhas políticas, os projetos neste sentido permanecem parados no Parlamento e provavelmente não sairão do lugar sem mobilização e pressão popular.
O sistema tributário brasileiro, com predominância do imposto indireto incidente sobre o consumo, é perversamente regressivo. Os mais pobres, as famílias com renda até dois salários mínimos, comprometem 49% do que ganham com o pagamento de tributos, de acordo com informações do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Já aqueles que embolsam mais de 30 salários mínimos por mês contribuem bem menos relativamente: 26%.
A CSGF é, portanto, uma medida de justiça tributária. Embora não substitua ou exclua a necessidade de uma reforma tributária mais ampla, trata-se de uma iniciativa relevante para reduzir as odiosas e arcaicas desigualdades sociais que caracterizam a sociedade brasileira e despertam vergonha nas mentes mais lúcidas e conscientes.
Países como França, Áustria, Suécia, Luxemburgo, Noruega, Suíça, Argentina, Colômbia, Uruguai, Espanha e Islândia já tributam as grandes fortunas. No Brasil será preciso superar a resistência das elites econômicas para implantar algo do gênero.
A tributação proposta é progressiva e modesta, devendo atingir apenas cerca de 56 mil contribuintes, segundo Jandira Feghali, sendo que 70% dos recursos devem provir dos 900 mais ricos, com patrimônio superior a R$ 115 milhões. Serão nove alíquotas, pagas anualmente, variando de 0,4% (para quem tem entre R$ 4 milhões a R$ 7 milhões) a 2,1% (patrimônio superior a R$ 120 milhões). Quem está na faixa inferior dará uma contribuição modesta, em torno de R$ 2 mil por ano.
O impacto para o milionário muquirana tende a ser desprezível quando se considera sua evolução patrimonial. Informações da Receita Federal, citadas pela deputada comunista, indicam que ao longo de 2009, ano de crise em que o PIB brasileiro recuou 0,6%, “o patrimônio das pessoas que superava a casa dos R$ 100 milhões elevou-se de R$ 418 bilhões para R$ 542 bilhões – 30% de crescimento em um único [e crítico] ano. Uma tributação adicional de 2% representa muito pouco para esse diminuto segmento social, mas representará um significativo aporte de recursos para a saúde pública, que atende 190 milhões de brasileiros.”
Não restam dúvidas de que o PLP nº 48/2011 merece e terá total apoio da CTB, das outras centrais sindicais, dos movimentos sociais e dos parlamentares progressistas. Muito embora a tributação das grandes fortunas esteja prevista na Constituição Cidadã (há 24 anos), não será concretizada sem luta. Sua aprovação requer ampla mobilização social. E é este o nosso desafio.
Wagner Gomes é presidente nacional da CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil).