Um ponto que sempre provoca acaloradas discussões no sindicalismo brasileiro é o fim do chamado “imposto sindical”. Em recente entrevista, o presidente do Tribunal Superior do Trabalho, ministro Oreste Dalazen, asseverou que a unicidade sindical e a contribuição sindical retiram do sindicato a liberdade de atuar como representante dos empregados. De acordo com o ministro, para que haja representatividade sindical é preciso haver uma mudança muito grande na estrutura sindical, de tal maneira que os sindicatos passem a viver exclusivamente da contribuição de seus associados. Ele defende sindicato por empresa.
A CTB defende o aperfeiçoamento do sistema sindical brasileiro, visando o fortalecimento do sindicalismo, da representação dos trabalhadores, do poder negocial, com estrita observância da regra e norma mais favorável, mas, sobretudo, da capacidade de luta das entidades sindicais pelos direitos dos trabalhadores brasileiros, sem permitir, em nenhuma hipótese, que as alterações propostas levem ao fracionamento e ao enfraquecimento dos sindicatos com grave prejuízo à luta da classe operária e dos demais trabalhadores deste país.
O fortalecimento dos sindicatos começa pelos seus princípios de unidade, baseada na unicidade sindical, com liberdade e autonomia. Na Constituição de 1988, os trabalhadores avançaram nesta conquista, rompendo com a estrutura ministerialista, com o estatuto padrão e ampliaram os direitos trabalhistas, estendendo-os aos trabalhadores rurais, legalizando a organização sindical dos trabalhadores no serviço público e proibindo a intervenção do estado nos sindicatos. Porém não conseguimos garantir o pleno direito de atividade sindical no local de trabalho.
Defendemos o aprofundamento da liberdade sindical com a instituição do direito de organização no local de trabalho, com caráter unitário vinculado ao sindicato com estabilidade no emprego eleito por todos os trabalhadores da base sendo a eleição organizada e coordenada pelo sindicato.
Defendemos a liberdade e a autonomia baseada na unicidade sindical. A unicidade sindical é o principal mecanismo para evitar a fragmentação e o sindicato por empresas.
Defendemos a contribuição sindical compulsória, porque para fazer a luta contra o capital os sindicatos precisam ter recursos. Sem os diversos recursos, os sindicatos não podem organizar as suas lutas.
Assim sendo, a estrutura sindical que defendemos começa pela comissão sindical de base unitária, no local de trabalho, unicidade sindical, sindicato único por categoria. Federação, Confederação e Central Sindical baseado em sindicatos filiados. A relação entre Sindicatos, Federação, Confederação e Central deve ser sempre a de filiação respeitando a autonomia de cada entidade.
Defendemos a contribuição compulsória, como fonte de sustentação financeira dos Sindicatos. Em todo mundo o sindicalismo tem fontes de recursos seja compulsório descontado em folha de pagamento. Onde não é assim a sustentação financeira vêm dos governos, e neste caso os sindicatos ficam atrelados ao estado.
Neste artigo vou citar como é em alguns países.
Na Argentina, o financiamento sindical é composto por cotizações ordinárias e extraordinárias de todos os trabalhadores sindicalizados ou não. Tem ainda a contribuição de solidariedade, conforme artigo 37 da Lei 23.551. Os empregadores são obrigados a descontar em folha de pagamento os valores e repassar para os sindicatos. O Ministério do trabalho especifica os valores que serão repassados para cada sindicato. Caso o empregador não faça esse repasse, o próprio empregador se torna devedor ficando obrigado a pagar as quantias, com as devidas multas.
Na Itália, existe a Lei 300/70 que no seu artigo 26 que estabelece que os trabalhadores têm direito de desenvolver atividades sindicais nos locais de trabalho, e ao mesmo tempo fixa os valores que os trabalhadores devem pagar para os sindicatos. Esses valores são descontados em folha de pagamento, mediante as modalidades estabelecidas pelos contratos coletivos de trabalho. A mesma lei garante o sigilo das quantias descontadas dos trabalhadores e repassadas para cada sindicato.
O caso da Espanha é eloquente. Além da contribuição de solidariedade (“canon de negociación”), os sindicatos recebem subvenções pela participação em órgãos públicos como seguro-desemprego, aposentadoria, pensões, saúde e segurança e outros, pela prestação de serviços junto a entidades governamentais que cuidam da formação profissional, supervisão da previdência complementar, convênios de saúde, etc. Além disso, recebem recursos das empresas: créditos horários para atividade sindical, ajuda às comissões intra-empresariais, atividades educacionais, esportivas, culturais e outras.
Na Europa, o recebimento de recursos do governo por participação em colegiados, comissões, comitês e órgãos públicos é generalizado. Na França, por exemplo, os sindicatos recebem verbas do governo para participar de órgão colegiado tripartites de níveis local, regional e nacional, recebem verbas das prefeituras e subvenções do Ministério do Trabalho para formação profissional, saúde e segurança, firma convênios e recebem recursos de ministérios para funções específicas na educação, saúde, agricultura, etc. Recebem subvenções contínuas do primeiro ministro para o funcionamento do IRES (Institut de Recherches Économiques et Sociales). Tais recursos representam cerca de 40% da receita total dos sindicatos franceses (Hubert Landier e Daniel Labbé, Les Organisations Syndicales en France, Paris: Les Editions Liasons, 2000).
Por força da CLT francesa, “Code du Travail”, art. 434-8, as empresas com mais de 50 empregados são obrigados a manter os “comitês de empresa” e ceder local, mobiliário, equipamento, meios de comunicação, para o bom funcionamento do chamado sindicato local. As empresas pagam aos comitês um mínimo de 0,2% da folha de salários, fixado em lei, ou outro valor, acertado no contrato coletivo de trabalho. Na prática, o percentual tem variado entre 0,5% e 2% – nas grandes empresas, chega a 5% da folha de salários (Patrick Duncombe,Le Comité d´ Enterprise dans le Cadre Européen, Paris: Hermesnet, 1998).
Será que ao propor o fim da contribuição sindical compulsória e a divisão sindical os responsáveis por isso terão de propor alternativas de sustentação financeira dos sindicatos? Será que o Brasil vai querer adotar os modelos acima citados nos quais trabalhadores, empresas e governo financiam os sindicatos? É isso que constitui um sindicalismo “livre e autônomo”?
O ministro Oreste Dalazen defendeu em seu artigo o modelo adotado para a organização sindical dos Estados Unidos, que conduz a práticas desleais peculiares. Naquele país, a representação sindical se dá por empresa, o sindicato é eleito para representar todos os empregados de uma empresa. A situação é muito desfavorável para os trabalhadores com o favorecimento por parte da empresa a um determinado sindicato ou a discriminação do próprio sindicato em relação ao empregado que foi contra a sua escolha, o que é comum, atos de ingerência e discriminação.
A prática antissindical é comum do empregador em relação aos empregados é a dispensa daquele que é eleito membro, ou que dá apoio ao sindicato. Para o sindicato adquirir o direito a negociação é necessária a obtenção de cinquenta por cento de associados dos trabalhadores da empresa. Não há negociação para os sindicatos não atinge esse percentual de sindicalizados. É exatamente esse modelo que o ministro presidente do TST defende sob o pretexto de diminuir as reclamações trabalhistas. Será que o modelo americano, em que o sindicato perde o seu poder negociar serve aos trabalhadores e trabalhadores do Brasil, ministro?
Pascoal Carneiro é secretário-geral da CTB.