Com desemprego em alta, crescem nos EUA as filas para refeições gratuitas

Milhões de escolares nos EUA estão recebendo refeições grátis ou por um custo subsidiado pela primeira vez, depois que seus pais, muitos dos quais se incluíam na classe média, perderam os empregos ou as casas com a crise econômica, qualificando suas famílias para o programa de segurança que existe há várias décadas.

O número de estudantes que está recebendo almoço subsidiado aumentou para 21 milhões no último ano escolar, contra 18 milhões em 2006-7, um aumento de 17%, segundo uma análise feita pelo “New York Times” de dados do Departamento da Agricultura, que administra o programa de refeições. Onze estados, incluindo Flórida, Nevada, Nova Jersey e Tennessee, tiveram aumentos de 25% ou mais em quatro anos, mudanças enormes em um vasto programa caracterizado pelo crescimento incremental.

O Departamento da Agricultura ainda não divulgou os dados de setembro e outubro. “São aumentos muito grandes, um reflexo direto das dificuldades que as famílias americanas estão enfrentando”, disse Benjamin Senauer, um economista da Universidade de Minnesota que estuda o programa de refeições, acrescentando que o aumento ocorreu tão rapidamente “que pessoas como eu, que fazem pesquisa, estão tendo dificuldades para acompanhá-lo”.

Em Sylva, Carolina do Norte, as demissões nas fábricas de madeira e papel levaram centenas de novos estudantes para as listas de almoço grátis. Em Las Vegas, onde o colapso da indústria da construção causou problemas, 15 mil novos estudantes entraram no programa de almoço subsidiado neste outono. Em Rochester, Nova York, engenheiros e técnicos desempregados inscreveram seus filhos depois que demissões na Kodak e outras empresas os deixaram sem trabalho. Muitos desses pais que tinham renda média pediram que as autoridades escolares mantivessem sua inscrição em segredo.

Estudantes de famílias com renda anual até 130% do nível de pobreza – US$ 29.055 para uma família de quatro pessoas – podem se candidatar para refeições grátis na escola. As crianças de uma família de quatro pessoas com renda anual até US$ 41.348 se qualificam para um almoço subsidiado que custa US$ 0,40.

As primeiras a chamar a atenção para os aumentos foram as autoridades do Departamento de Educação, que usam os índices de almoço subsidiado como um indicador de pobreza em testes federais. Este mês, ao divulgar resultados da Avaliação Nacional de Progresso Educacional, elas notaram que a proporção de alunos da quarta série que se matricularam no programa de almoço havia subido de 49% em 2009 para 52%, cruzando um divisor de águas simbólico.

Nas escolas municipais de Rockdale, perto de Atlanta, a porcentagem de estudantes que recebem almoços subsidiados aumentou para 63% este ano, contra 46% em 2006. “Estamos vendo pessoas que antes não se qualificavam, nunca tiveram necessidade”, disse Peggy Lawrence, diretora de nutrição da escola.

Uma delas é Sheila Dawson, uma vendedora da Walmart cujo marido perdeu o emprego como gerente de uma Waffle House no ano passado, reduzindo sua renda em US$ 45 mil. “Estamos fazendo o possível para economizar”, disse Dawson, que tem uma filha de 15 anos. “Compramos roupas na loja de descontos, assistimos menos filmes e este ano minha filha se qualifica para um almoço a preço reduzido.” Ela acrescentou: “Minha sensação é de que pagamos impostos todos esses anos e foi para isso que serviram”.

Embora os distúrbios econômicos sejam o principal fator dos aumentos, dizem especialistas, algum crescimento marginal resultou de uma nova maneira de qualificar os estudantes para as refeições subsidiadas, conhecida como certificação direta.
Em 2004, o Congresso requereu que os 17 mil distritos escolares do país comparassem as listas de matrículas dos estudantes com registros das agências locais de cupons alimentares, inscrevendo diretamente aqueles que recebiam cupons nos programas de refeições. O número de distritos que faz isso tem aumentado – assim como o número de filhos em idade escolar e famílias qualificadas para cupons alimentares, para 14 milhões em 2010-11 contra 12 milhões em 2009-10.

“A preocupação das pessoas envolvidas na iniciativa de certificação direta é como ajudar todos esses distritos a lidar com a explosão de crianças que se qualificam para as refeições”, disse Kevin Conway, diretor da Mathematica Policy Research e coautor de um relatório sobre a certificação direta feito em outubro para o Congresso.

O Congresso aprovou a Lei Nacional do Almoço Escolar em 1946 para sustentar os preços das matérias-primas depois da Segunda Guerra Mundial, ao reduzir os superávits agrícolas enquanto fornecia alimento para os escolares. Em 1970 o programa fornecia 22 milhões de almoços por dia em média, cerca de um quinto deles subsidiados. Desde então a parte subsidiada cresceu, enquanto os almoços pagos diminuíram, mas desde 1972 não havia tantas crianças a mais qualificadas para almoços grátis como no ano fiscal de 2010: 1,3 milhão. Hoje é um programa de US$ 10,8 bilhões que fornece 32 milhões de almoços, 21 milhões dos quais são grátis ou com preço reduzido.

Todos os 50 estados americanos apresentaram aumentos, segundo o Departamento da Agricultura. Na Flórida, que tem 2,6 milhões de alunos nas escolas públicas, 265 mil estudantes a mais se qualificaram para subsídios desde 2007, com aumentos em virtualmente todos os distritos.

“O crescimento foi generalizado”, disse Mark Eggers, autoridade do Departamento de Educação da Flórida que supervisiona o programa de almoço.

No Tennessee, o número de estudantes que recebe refeições subsidiadas cresceu 37% desde 2007. “Quando uma fábrica fecha, nossos distritos escolares têm um grande aumento”, disse Sarah White, diretora estadual de nutrição escolar.

Em Las Vegas, com 13,6% de desemprego, a inscrição de milhares de novos estudantes no programa de almoço subsidiado obrigou o distrito do condado de Clark a acrescentar um turno extra na cozinha central, que é do tamanho de um campo de futebol, disse Virginia Beck, diretora-assistente do serviço de alimentação escolar.

Em Roseville, Minnesota, um subúrbio residencial próximo a St. Paul, a proporção de estudantes com almoços subsidiados aumentou para 44% neste outono, contra 29% em 2006-7, segundo o economista Senauer. “Há muita dificuldade nos subúrbios”, ele disse. “É a nova face da pobreza.”

Em Nova York, o distrito escolar de Gates Chili, perto de Rochester, perdeu 700 estudantes desde 2007-8, pois muitas famílias deixaram a área depois das demissões em massa. Mas durante os mesmos quatro anos o programa de almoço subsidiado ganhou 125 bocas, muitas delas de filhos de gerentes e técnicos da Kodak e da Xerox, que antes pensavam ter empregos vitalícios, disse Debbi Beauvais, supervisora do programa de refeições no distrito. “Os pais que matriculam seus filhos dizem: ‘Nunca pensei que um programa como este serviria para mim e meus filhos'”, disse Beauvais.

Muitos grandes distritos escolares urbanos têm predominância há anos de alunos pobres que se qualificam para o almoço subsidiado. Em Dallas, Newark e Chicago, por exemplo, cerca de 85% dos alunos se qualificam, e a maioria das escolas também oferece café da manhã grátis. Hoje alguns lugares adicionaram programas de jantar grátis, temendo que crianças necessitadas passem fome à noite.

Um deles é o distrito de Hickman Mills C-1, em Kansas City, Missouri, um bairro onde uma loja Home Depot, um shopping center e uma série de mercearias fecharam.

Dez anos atrás, 48% de seus estudantes se qualificavam para almoços subsidiados. Em 2007 a porcentagem tinha aumentado para 73%, disse Leah Schmidt, diretora de nutrição do distrito. No ano passado, quando atingiu 80%, o distrito começou a dar a 700 estudantes uma terceira refeição paga pelo Estado, todas as tardes depois das aulas. “Este é o período de maior carência que já vi em meus 20 anos de profissão”, disse Schmidt.

Fonte: New York Times

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