O Sindicato dos Jornalistas de São Paulo realizou no dia 31, um dia antes da data comemorativa do Dia da Imprensa, ato de desagravo aos seis jornalistas agredidos por policiais militares e guardas civis durante a chamada Marcha pela Liberdade de Expressão (ou “Marcha da Maconha”), realizada no dia 21 de maio, nas proximidades da Avenida Paulista.
O ato “Contra Violência e em Defesa da Liberdade de Expressão”, reuniu o repórter Fábio Pagotto e o fotógrafo Vinícius Pereira (Diário de S. Paulo) e Osmar Bustos (Cremesp e correspondente do jornal Página 12 e Toda Notícia, de Buenos Aires). Eles relataram as agressões sofridas durante a cobertura da manifestação. Após os participantes elaboraram em conjunto carta aberta sobre a violência da PM contra os jornalistas, que será encaminhada às principais autoridades do Estado de São Paulo.
Ao abrir a atividade, o presidente do Sindicato, José Augusto Camargo (Guto), registrou que a entidade fez questão de trazer os jornalistas para relatarem suas experiências na data que antecede a comemoração do Dia Nacional da Imprensa (1º de junho).
“Este é um ato de desagravo contra violência e de solidariedade aos colegas que deveriam ter o direito a liberdade de imprensa assegurado. Estamos aqui para ouvir o relato dos companheiros e aprovar documento de repúdio que será enviado às autoridades. É impossível que Estado brasileiro compactue com tal episódio lamentável, que nos remete ao tempo do regime militar”, disse Guto.
As agressões: O primeiro testemunho foi do repórter Fábio Pagotto, que estava a serviço do Diário de São Paulo. “Estávamos cobrindo a Marcha que até então transcorria pacificamente. De repente, a barreira que separava os manifestantes que eram a favor e contra da legalização da maconha foi desfeita. Logo em seguida, começou o confronto. Nesse momento, a polícia prendeu um manifestante que distribuía um manifesto. Foi o estopim para que os que se concentravam no vão do Masp, ocupassem a Avenida Paulista em forma de protesto”.
De acordo com Fábio, a Tropa de Choque foi formada e era possível avistar os cacetetes. “Eu me dirigi até o capitão Del Vecchio (policial militar que chefiou a operação) para saber se era necessário utilizar todo aquele aparato policial. Ele respondeu: fiquem fora disso porque vamos dispersar esta marcha. A partir daí, a coisa ficou violenta, com disparos de balas de borracha, bombas de efeito moral, gás lacrimogêneo e gás pimenta contra a multidão e jornalistas.”
O repórter contou que quando parou para fazer suas anotações sentiu um jato de spray de pimenta e, com a visão embasada, percebeu que o mesmo policial seguia em direção ao fotógrafo que trabalhava com ele. “Eles abaixaram a câmera fotográfica para jogar spray no Vinícius. Continuei seguindo a marcha e, novamente me dirigi ao Capitão para saber o motivo de tanto violência. Nesse momento uma bomba de efeito moral foi jogada ao lado de outro jornalista. Foi quando deixei escapar um “covarde”! Nisso fui cercado por vários policiais que começaram a dar pancadas”.
“Eu indaguei: vocês vão me bater? A resposta foi: você não vai falar com ninguém e de repente um deles passou com uma moto em cima do meu pé. Ele desceu da motocicleta com a mão cerrada, ele estava de capacete e sem identificação, mas foi seguro pelo capitão. Eu novamente tomei satisfação: o que está acontecendo. O senhor perdeu o controle dos seus homens? Então aconteceu uma das coisas mais ridícula que já vi na minha vida! O mesmo policial que havia me agredido se escondeu no meio dos outros quando o capitão pediu para que eu identificasse o agressor”, ressaltou Pagotto.
Segundo ele, no decorrer do percurso outras agressões ocorreram contra jornalistas e manifestantes. “Voltamos para a redação para fazer a matéria. No outro dia senti dores na minha perna. Procurei um médico e ele diagnosticou esmagamento de tecidos. Tive que ficar com o pé imobilizado por 5 dias”.
“A atuação deixou claro que eles estavam mal intencionados. Uma semana antes, em outra manifestação semelhante, eles perderam o controle e não conseguiram impedir os manifestantes. A Polícia Militar é um resquício da ditadura militar. Ela é uma instituição repressiva e preconceituosa”, argumentou Fábio.
Já o fotógrafo Vinícius complementou “desde o início deu para perceber a má intenção da polícia. Primeiro fui empurrado contra uma parede na tentativa de impedir que eu fotografasse, depois no decorrer da passeata foi o spray de pimenta. Isso sem falar nas demais agressões que presenciamos ao longo da manifestação”, ressaltou.
Para o fotógrafo Osmar Bustos, atingido por duas balas de borracha, a violência foi programada. “Eu acho que caímos numa armadilha muito bem feita. Já participei de muitas manifestações e, em momento algum, pensei que eles realmente fossem atirar. Foi uma violência premedita em pleno Estado democrático de direito”.
“O cordão de isolamento foi rompido e de repente começou a chover bombas de efeito moral – uma caiu ao meu lado. Assistimos a um espetáculo covarde ao ponto de disparar balas de borracha – fui atingido por duas delas nas costas e tive que ser socorrido. É uma situação inaceitável! Fomos vítimas de uma polícia que deveria preservar a ordem e isso não ocorreu. Precisamos dar uma resposta para que isso não volte a acontecer.”, enfatizou.
A reação: Para o coordenador do Departamento de Comunicação do Sindicato dos Jornalistas, Simão Zygband, o que chamou mais atenção foi a dificuldade de levantar os fatos do episódio. “Ao saber da violência da PM durante a Marcha pela Liberdade de Expressão tomamos a decisão de averiguar a história, mas não conseguimos, porque a maioria dos jornais não abordou o assunto. Então, chegou o Osmar para denunciar a agressão e as coisas começaram a se esclarecer. Antigamente, quando um jornalista era agredido, a empresa responsável pelo profissional tomava providências. E neste episódio não vimos publicamente isto. Por isso, o Sindicato tomou a decisão de realizar a atividade”.
Os jornalistas Ricardo Galhardo (iG), que chegou a ser detido e constrangido pelos policiais, Félix Lima (da Folha.com) que recebeu jatos de gás pimenta e foi derrubado e teve seu equipamento fotográfico arrancado por uma guarda civil metropolitana e Márcia Abos (O Globo), que foi atingida por golpe com escudo foram convidados para o ato de desagravo, mas não puderam comparecer. Ricardo Galhardo e Márcia Abos registram Boletim de Ocorrência (B.O.). Fábio Pagotto disse que pretende entrar com processo contra o Estado.
O departamento Jurídico do Sindicato está aberto aos jornalistas que quiserem encaminhar processos ou esclarecimentos. Ele orienta que os profissionais agredidos além B.O. façam a Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), formulário que deve ser preenchido pela empresa para configurar acidente de trabalho.
Fonte: Sindicato dos Jornalistas de SP