Enquanto o Brasil apenas nesta semana reconheceu que os casais homossexuais devem ter os mesmos direitos que os heterossexuais em união estável – e por decisão do Supremo Tribunal Federal, e não do Congresso Nacional -, o Parlamento da Argentina aprovou a lei de união civil entre pessoas do mesmo sexo em julho do ano passado.
A decisão ocorreu em meio a intensos debates no plenário, divisões dentro do governo da presidente Cristina Kirchner e pressões da Igreja Católica, cujas autoridades alertavam para um iminente “apocalipse” que cairia sobre a sociedade na sequência. Desde a aprovação, que teve aplicação quase imediata, só dois juízes se recusaram a celebrar a união civil, argumentando “objeções de consciência”.
Não há dados oficiais sobre o número de casamentos entre pessoas do mesmo sexo nos últimos dez meses, já que os registros civis exibem elevada autonomia, além de falta de coordenação com o Ministério do Interior. Segundo estimativas de organizações de defesa dos direitos dos homossexuais, teriam ocorrido mais de 1,3 mil casamentos do gênero no país.
ONGs do setor indicaram que o número de cerimônias cresceu mês a mês, já que “preparar um casamento é coisa que leva tempo. Poucos casais tinham tudo pronto para casar quando a lei foi aprovada no ano passado”.
A lei também teve efeito sobre um punhado de padres católicos, que – apesar das ordens contrárias – celebraram casamentos religiosos entre pessoas do mesmo sexo. Os clérigos foram posteriormente suspensos de suas funções.
Resultado
Andrea Majul e Silvina Maddaleno, ambas locutoras, dubladoras e publicitárias, conheceram-se em 1992. Namoraram por dois anos e foram morar juntas. Em 2007, Silvina fez uma inseminação artificial, da qual nasceram três crianças: Abril, Jazmín e Santiago. Em outubro passado, elas foram ao Registro Civil da Rua Uruguai, em pleno centro portenho, para pronunciar o “sim, aceito”.
Andréa conta que o casamento deu segurança em relação à área legal. “Com a lei, sei que minha cônjuge está protegida. E podemos pedir crédito bancário como casal, coisa que antes era impossível. Também podemos pagar impostos como casal.”
Segundo Andréa, o desafio é que a lei permita o reconhecimento dos filhos nascidos antes do casamento. “Temos filhos que nasceram antes da lei. E, como a lei não é retroativa, ela só reconhece a Silvina como mãe. Ou seja, as crianças não podem receber meus direitos de plano de saúde ou minha herança.
Por isso, as organizações Diversidade e Direitos, Lesmadres e o Centro de Estudos Sociais e Legais (Cels) estão lutando na Justiça e na área política para a aplicação do reconhecimento igualitário. Queremos que os filhos nascidos antes do casamento igualitário tenham os mesmos direitos daqueles nascidos depois do casamento”, explica.
Andréa destaca que, “do ponto de vista subjetivo, o casamento reconhecido pela lei tem muito mais força que o reconhecimento social ou cultural”. Além disso, “para as crianças é importante também, já que é uma ratificação importante do vínculo entre as duas mães”. Depois, arremata com uma gargalhada: “E, acima de tudo, agora sou “senhora” e não mais “senhorita”!”
No Brasil, é preciso mudar a legislação
Mesmo com a decisão histórica que os ministros do Supremo tomaram por unanimidade na quinta-feira, o Brasil ainda não permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Para que o casamento homossexual seja permitido no País é preciso mudar a legislação brasileira, que estabelece que o ato civil do casamento só pode acontecer entre sexos opostos.
No casamento, a pensão e o plano de saúde, entre outros direitos, estão implícitos. Assim, quando um cônjuge morre, a herança está subentendida. No caso das uniões estáveis, tanto heterossexual como homossexual, é preciso recorrer à Justiça para assegurar esses direitos. Com a nova orientação, o processo deve ser mais rápido e fácil. Antes, cada tribunal reagia de uma forma. Agora, o entendimento sobre a jurisprudência está uniformizado.
Fonte: O Estado de S.Paulo