Em Antenas, onde participa do 16º Congresso da Federação Sindical Mundial (FSM), o presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil, Wagner Gomes, enfatizou nesta quinta-feira (7) a luta contra o imperialismo e enaltece a mudança do cenário político na América Latina.
Leia abaixo a íntegra da sua intervenção no evento classista:
Transmito aqui a saudação da CTB e da classe trabalhadora brasileira aos delegados deste 16º Congresso da Federação Sindical Mundial, um evento de grande importância que reafirma a orientação classista da entidade e contribui para a unidade dos trabalhadores em todo o mundo.
A CTB representa 6 milhões de trabalhadores no Brasil e já na sua fundação, em dezembro de 2007, se filiou à FSM, compreendendo que este é o caminho do sindicalismo classista, anticapitalista, que luta pela completa emancipação do proletariado. Apostamos na construção das UIS da federação, participando da organização dos ramos de transportes, energia, finanças, construção e serviços públicos.
Contribuímos também para a articulação e unidade classista do continente americano que resultou na criação do Encontro Sindical Nossa América.
Reconhecemos o avanço da FSM em várias frentes desde o congresso de 2005.
Companheiros e companheiras,
Transmito agora, respeitosamente, algumas opiniões sobre o documento em debate.
Avaliamos que o documento, a par das contribuições e do espírito classista, não consegue captar em sua plenitude as particularidades, diversidades e divergências no processo histórico de desenvolvimento econômico e político das nações.
Transparece, no texto, uma visão predominantemente da realidade da Europa, não expressando, por exemplo, singularidades do atual quadro mundial, o que é uma necessidade pelo caráter global da FSM.
A crise mundial é apresentada como uma crise geral do capitalismo e isto é verdade. Mas o caráter desigual e a assimetria de suas manifestações nos países e regiões não são explicitados.
O documento não confere a devida relevância à chamada questão nacional, o que conduz a uma subestimação das múltiplas dimensões da luta contra o imperialismo, e tampouco aprecia e valoriza a mudança do cenário político na América Latina, em curso desde a primeira eleição de Hugo Chávez na Venezuela, em 1998.
A crise econômica acentuou o desenvolvimento desigual das nações e o deslocamento do poder econômico mundial do Ocidente para o Oriente e, destacadamente, dos EUA para a China, um país dirigido pelo Partido Comunista e que se considera socialista.
Ao longo das últimas décadas, a próspera nação asiática logrou um crescimento médio anual em torno de 10%, ininterrupto, ao passo que as três maiores potências capitalistas (EUA, Japão e Alemanha) amargaram o declínio de suas taxas de expansão para cerca de 2% e foram perturbadas por crises recorrentes. Notemos que as crises cíclicas de superprodução, acompanhadas da recessão e altas taxas de desemprego, são características do modo de produção capitalista que, até o momento, não se manifestaram na China.
O desenvolvimento desigual promoveu uma transformação silenciosa no cenário econômico. O poderio econômico relativo das nações já não é o mesmo e isto naturalmente não poderia deixar de repercutir na geopolítica.
Esta nova realidade configura uma crise da ordem mundial fundada na hegemonia dos Estados Unidos e remanescente da 2ª Guerra. Verifica-se uma convergência entre a crise econômica do capitalismo e a crise da hegemonia dos Estados Unidos.
A necessidade de uma transição para uma nova ordem internacional assume caráter objetivo, mas não se fará sem luta. A FSM não pode ficar à margem desta realidade.
É nosso dever elevar o protagonismo da classe trabalhadora na luta por uma nova ordem mundial e lutar para conferir às mudanças um sentido social avançado, anticapitalista.
É indispensável debater e procurar compreender o papel da China, cuja ascensão altera a correlação de forças no mundo, em detrimento do imperialismo ocidental, e tende a favorecer a luta dos povos pela emancipação econômica, social e política.
Os Estados Unidos reagem ao declínio nos planos econômico e político ampliando o poderio militar e intensificando a agressividade. A guerra imperialista contra a Líbia é mais uma prova disto.
O baixo dinamismo das potências capitalistas reflete uma taxa de lucro e de acumulação de capital significativamente inferior à verificada nas economias ditas emergentes e, em especial, na China. Isto explica a migração do capital dos velhos centros imperialistas em direção aos países considerados emergentes, gerando o fenômeno da deslocalização, com repercussões negativas para a classe trabalhadora nos países mais industrializados. Ao mesmo tempo, este movimento do capital respalda o deslocamento da dinâmica industrial e do poder econômico mundial do Ocidente para o Oriente e dos EUA para a China.
É um equívoco colocar um sinal de igualdade entre o que ocorre na Europa, onde o impacto da crise é mais grave, e em países da Ásia e América Latina que já saíram da recessão e crescem a ritmo relativamente acelerado, ampliando a oferta de emprego e propiciando a valorização, ainda que modesta, dos salários. Os dilemas não são os mesmos.
O cenário político da América Latina mudou notavelmente ao longo dos últimos anos. Depois da primeira eleição de Hugo Chávez, na Venezuela, vários países da região rejeitaram as políticas neoliberais e votaram massivamente em governantes progressistas, ligados aos movimentos sociais, que buscam um caminho de desenvolvimento autônomo para suas nações, alternativo ao Consenso de Washington e independentes do imperialismo norte-americano.
As experiências mais avançadas estão sendo desenvolvidas na Venezuela e Bolívia, que proclamam abertamente objetivos socialistas e tentam abrir caminho nesta direção.
Construíram, junto com Cuba, a Alba (Aliança Bolivariana para os Povos da Nossa América), uma iniciativa de integração fundada em princípios socialistas, em contraposição ao espírito mercantilista que orienta as relações no interior de outros blocos econômicos.
Outros movimentos no sentido de integração foram realizados, com a criação da Unasul; Conselho de Defesa Sul-Americano; Banco do Sul; Celac (Comunidade da América Latina e do Caribe); o fortalecimento do Mercosul. Em conjunto, essas iniciativas configuram um movimento objetivo de resistência ao imperialismo, que se contrapõe ao domínio imperial secular dos Estados Unidos no continente americano.
Nessas circunstâncias, é inevitável que a classe trabalhadora e as forças progressistas confiram prioridade à luta contra o imperialismo e em defesa da soberania. É óbvio que os países europeus não vivem o mesmo dilema. A FSM não pode ignorar as particularidades e diferenças.
A maior unidade econômica e política dos países latino-americanos é que possibilitou, com o respaldo dos movimentos sociais, a rejeição e derrota da Alca, consumada em 2005. As lutas sociais nas Américas estão entrelaçadas com as lutas nacionais pela soberania e verdadeira independência econômica e política frente aos EUA e demais potências capitalistas.
Lembremos que a Alca foi criada na Cúpula das Américas realizada em Miami, nos EUA, em 1994, com a presença de 34 chefes de Estado do continente (e a exceção de Cuba), sendo que todos assinaram a proposta da área de livre comércio. É notório o contraste entre aquela época, em que a hegemonia de Washington parecia absoluta, e hoje, quando o declínio de sua influência política salta aos olhos.
O sindicalismo classista, ligado à FSM, é solidário com o movimento de integração e na medida em que este se afirma em oposição ao imperialismo norte-americano vai conformando um novo cenário e uma nova realidade geopolítica na América Latina. Ao mesmo tempo, é preciso lutar, mobilizar os trabalhadores com o objetivo de radicalizar as mudanças e conferir um sentido social mais avançado, anticapitalista, às transformações. O Encontro Sindical Nossa América (Esna) é uma importante iniciativa neste sentido.
A FSM deve refletir a diversidade e refletir mais atentamente sobre seu significado. O documento deve contemplar uma avaliação sobre o papel da China na atual conjuntura e na luta contra o imperialismo.
Entendemos que a defesa dos interesses dos trabalhadores, diante da atual correlação de forças desfavorável ao movimento operário internacional, requer também a exploração das contradições no seio das classes dominantes pelo sindicalismo de classe, como também desenvolver a sabedoria de combinar unidade e luta no movimento sindical. É necessária a elaboração de uma plataforma de unidade dos sindicatos e da classe trabalhadora na ação concreta em cada país, que busque o caminho para a emancipação de classe, com a conquista de uma nova sociedade sem explorados e nem exploradores.
Por último, uma palavra sobre o meu país, o Brasil. A CTB, desde sua fundação, defende um projeto nacional de desenvolvimento com valorização do trabalho. Consideramos que os trabalhadores, para serem protagonistas dessa luta, devem consolidar e avançar sua unidade.
Seis centrais sindicais brasileiras realizaram uma importante Conferência Nacional, em 2010, com cerca de 30 mil trabalhadores. Aprovaram por consenso uma Agenda dos Trabalhadores que serve de carro-chefe para a unidade e a mobilização sindical em nosso país.
A partir dessa agenda, e preservando a sua autonomia, a CTB considera que pode avançar e aprofundar as mudanças em curso no Brasil. A vitória da coligação encabeçada pela presidente Dilma Rousseff contribui para isso.
Consideramos que na atual etapa de acumulação estratégica de forças para avançar rumo à transição para o socialismo, o sindicalismo brasileiro deve lutar, com unidade e luta, pela viabilização dessa Agenda.
Companheiros são essas as respeitosas contribuições da CTB.
Viva a FSM! Viva a Luta dos Trabalhadores e Trabalhadoras de todo o mundo!
Muito obrigado
Wagner Gomes, presidente da CTB