É hora de relançar a campanha pelas 40 horas


Ocorreu em meados do ano passado, na cidade de São Paulo, a última reunião do comando da campanha dos sindicatos pela redução da jornada de trabalho sem redução de salários. Estiveram presentes representantes de todas as centrais sindicais, assessorados pelos técnicos do Dieese, e eu participei pela CTB, ao lado do secretário adjunto de Relações Internacionais da Central, João Batista Lemos.

Discutimos na ocasião a oportunidade de relançar a campanha pelas 40 horas semanais. O ambiente era então dominado por um excesso de euforia em relação ao comportamento da economia nacional, que afinal experimentou no primeiro semestre de 2008 o auge de um promissor ciclo de expansão, frustrado meses depois. Julgava-se, então, que a crise não aportaria nesses trópicos.

Alimentava-se também a ideia de que o crescimento da economia nacional jogava água no moinho dos trabalhadores, ao passo que um cenário de estagnação ou recessão forçaria a classe trabalhadora e o movimento sindical à defensiva e prejudicaria a campanha. A vida, sempre mais sábia que a imaginação humana, está mostrando que as coisas não são bem assim.

A crise

Sem pedir licença ao governo ou ao movimento sindical, a recessão global (exportada pelos EUA) resolveu nos visitar no último trimestre de 2008. Chegou com força, derrubando o PIB, expandindo o desemprego e atropelando a agenda sindical. A campanha pela redução do tempo de trabalho foi deixada em banho maria.

Contrariando os prognósticos, a luta pela redução da jornada não arrefeceu e, a bem da verdade, ganhou novo e inusitado impulso com a crise. Isto ocorreu fundamentalmente porque o movimento sindical não ficou inerte e teve a sabedoria de levantar a bandeira das 40 horas Já em resposta ao desemprego, que avançou com velocidade insuspeita nos últimos meses do ano passado, desacelerando posteriormente.

Vitória histórica

Como resultado da pressão unificada dos sindicalistas, que lideraram diversas manifestações em defesa do emprego, dos salários e dos direitos sociais ao longo deste ano (cabendo destacar o Dia Nacional de Luta em 30 de março e o 1º de Maio), a classe trabalhadora obteve uma vitória histórica no Congresso Nacional dia 30 de junho.

Naquele dia uma comissão especial da Câmara Federal aprovou por unanimidade o parecer do deputado Vicentinho (PT-SP) favorável à PEC dos senadores Inácio Arruda (PCdoB-SP) e Paulo Paim (PT-RS) que institui a redução constitucional da jornada para 40 horas semanais e eleva o adicional de horas extras para 75%. Foi uma grande notícia para a sociedade brasileira e um dia histórico para o sindicalismo, apesar do fato ser solenemente ignorado e sonegado pela mídia capitalista, que não prima pelo respeito à verdade e ao povo trabalhador. A “Folha” fez um editorial contra, destilando o ódio venenoso do grande capital contra a decisão dos parlamentares.  

Unidade

A vitória deve ser atribuída em primeiro lugar à unidade alcançada pelas centrais, mas é também um sinal do tempo. Em outras circunstâncias históricas, num momento de crise a proposta dificilmente seria apreciada pelo Congresso e, se fosse, o resultado provavelmente seria outro.

Vivemos um novo cenário político na América Latina, no qual cresce o protagonismo da classe trabalhadora e do sindicalismo. Ademais, o presidente Lula, que ingressou na política através do movimento sindical, já manifestou publicamente seu apoio à redução da jornada de trabalho sem redução de salários.

Agenda do trabalho

A unidade é que possibilitou a ampliação da influência e do protagonismo do movimento sindical. No dia 21 de maio representantes das centrais estiveram reunidos com o presidente da Câmara Federal, Michel Temer, e outros parlamentares para definir uma “agenda positiva do trabalho” na Casa, com destaque para a redução da jornada.   

Embora seja um fenômeno eminentemente econômico, a redução da jornada é uma questão polêmica, que se decide no campo da política e demanda luta. Por isto, não é de estranhar que, mesmo num ambiente de crise econômica, o tema ganhe força, já que a situação política é bem mais favorável do que no passado.

Surpresa

A unanimidade a favor da demanda dos sindicalistas na comissão especial que examinou a proposta foi uma grata surpresa para os trabalhadores e trabalhadoras que lotaram o auditório Nereu Ramos, onde a comissão especial se reuniu, mas não esperavam tanto.

O fato demonstrou que é significativa a força desta bandeira histórica da classe trabalhadora, assim como o respeito gozado pelos sindicalistas no Congresso Nacional pelos sindicalistas e a sensibilidade dos parlamentares à pressão da classe trabalhadora. O bom senso indica que a redução da jornada é a melhor resposta ao avanço extraordinário da produtividade social do trabalho, que sem tal medida se traduz, no capitalismo, em demissões e desemprego em massa.

Reação do capital

É também verdade que o patronato negligenciou a batalha na comissão especial. Isto não significa que está disposto a aceitar passivamente as 40 horas semanais. Entidades representativas do capital já estão reagindo. A CNI (Confederação Nacional da Indústria) elaborou uma cartilha francamente hostil à PEC dos senadores Arruda e Paim.

O principal argumento dos sindicatos é de que a redução da jornada vai gerar novos postos de trabalho. Os patrões contestam esta perspectiva, argumentando que a medida vai provocar mais demissões. Todavia, a posição dos capitalistas soa falsa quando se observa que o próprio presidente da Fiesp (Federação das Indústrias de São Paulo), Paulo Skaf, propôs a redução da jornada com redução de salários (o que os trabalhadores não aceitam) para combater o desemprego. A preocupação do capital não é com o nível de emprego, é exclusivamente com a defesa das (altas) margens de lucro, que se nutre do trabalho não remunerado dos assalariados.

O movimento sindical ainda não ganhou a guerra. A batalha final se dará no plenário do Congresso (Câmara e Senado) e será mais difícil, pois emenda constitucional requer quórum qualificado e a correlação de forças no parlamento não favorece os interesses da classe trabalhadora.

É hora de intensificar a mobilização e programar o relançamento da campanha pelas 40 horas Já. Mais do que uma oportunidade do momento histórico, a campanha nacional é uma necessidade indeclinável e inadiável.


Umberto Martins é jornalista e editor do Portal CTB

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