Depois do vale transporte, refeição e alimentação, o próximo benefício para o trabalhador brasileiro será o Vale Cultura. A princípio pode parecer inusitado, mas o programa está prestes a virar realidade: o presidente Lula participa na tarde desta quinta-feira (23), em São Paulo, da cerimônia que oficializa o envio do projeto de lei ao Congresso Nacional.
A ideia é disponibilizar uma espécie de tíquete nos mesmos moldes em que o vale refeição funciona hoje, só que para consumo cultural. Serão R$ 50 que vão poder ser usados na compra de livros, discos, ingressos de cinema, teatro, museus, shows e aluguel de filmes, mas apenas em locais credenciados. Alguns detalhes ainda precisam ser definidos, embora o Ministério da Cultura (Minc) adiante que planeja um mecanismo similar ao utilizado pelos outros benefícios, com um cartão magnético. Se não utilizar todo o crédito, o trabalhador pode usar o saldo restante no mês seguinte.
De acordo com o secretário executivo do MinC, Alfredo Manevy, a paternidade do programa é do ex-ministro da Cultura Gilberto Gil, numa tentativa de combater o "apartheid cultural" que existe no País. "É uma das respostas às distorções da Lei Rouanet, que em 18 anos, não gerou mais acesso à cultura", afirma. "Um estudo do IBGE de 2006 apontou que apenas 10% dos brasileiros têm acesso à cultura. No total, 90% da população não frequenta museus e exposições de arte e 86% não vão ao cinema", completa.
Um projeto similar tramitava desde 2006 no Congresso. De autoria do deputado José Múcio Monteiro (PTB-PE), hoje ministro das Relações Institucionais, esse Vale Cultura foi aprovado por todas as comissões pelas quais passou, mas esbarrou em um obstáculo legal, já que pedia a criação de uma despesa orçamentária extra, o que é vetado pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Além de especificar generalidades do texto anterior, o projeto do governo Lula driblou o impedimento através da renúncia fiscal.
"O empregado contribui com 10% do valor do vale, o equivalente a R$ 5 por mês", explica Manevy. "Os 90% restantes ficam por conta da empresa, que terá o benefício fiscal de abater com este gasto até 1% do seu imposto de renda. Ou seja, a contrapartida do governo é a não-arrecadação deste imposto. Caso a empresa ultrapasse este valor, o custo da implantação do Vale Cultura fica por conta apenas da empresa."
Impacto bilionário na economia
O foco do programa é para trabalhadores que ganham até cinco salários mínimos, o que, segundo dados da Receita Federal, deve englobar 12 milhões de pessoas. O empregador também está autorizado a disponibilizar o vale aos funcionários que recebem mais do que isso, desde que todos com renda inferior já sejam beneficiados ou tenham aberto mão do benefício.
A adoção do Vale Cultura é optativa pelas empresas, mas o MinC espera que, em um primeiro momento, o benefício seja incorporado de pronto pelas grandes pagadoras de impostos. "Imaginamos que os maiores interessados serão as companhias 'tributadas em lucro real', como estatais e as maiores empresas do País, com faturamento a partir de R$ 50 milhões", aponta o secretário executivo do ministério. "Sindicatos e outras entidades de classe podem ter interesse em incentivar a aprovação do projeto, para que na cesta básica do trabalhador seja incluído o consumo de cultura também."
A previsão do MinC é que a adoção do vale injete na indústria cultural R$ 600 milhões por mês, o equivalente a R$ 7,2 bilhões por ano. "É estratégico para um país com a importância do Brasil no cenário econômico mundial que se desenvolva a cultura de seu povo", afirma Manevy. Apesar da habitual morosidade das votações no Congresso, a expectativa é de que, pela boa aceitação da proposta, o projeto de lei tenha tramitação rápida e, espera-se, seja aprovado ainda em 2009.
Informações de Camila Campanerut