Bush pretendia impor a Honduras a presença de Posada Carriles

Em 24 de janeiro de 2006, três dias antes de subir à presidência Manuel Zelaya, o jornal The Miami Herald — cujos laços com a inteligência norte-americana ficaram bem demonstrados — citou o que chamou de "trechos" de uma Declaração do Bureau de Imigração e Controle Alfandegário (ICE), que assinalava o seguinte: "O ICE está avançando na implementação da extradição do senhor Posada dos Estados Unidos".

"Um juiz de imigração suspendeu a deportação para Cuba e para a Venezuela. Contudo, isso não impede o ICE de deportá-lo para um terceiro país. O ICE está em processo de fazer uma revisão rotineira de sua custódia", prosseguia o documento mencionado pelo jornal da cadeia McClatchy.

A revisão não tinha muito de rotineira. Na verdade, naquele momento, a Casa Branca — ameaçada com um escândalo internacional — o que estava pensando era como soltar a "batata quente" que representa o ex-agente, terrorista, torturador e assassino, e procurar-lhe um refúgio em qualquer lugar fora do território norte-americano.

Em 27 de setembro de 2005, um juiz de imigração de El Paso, no Texas, William Abbott, executando ordens do Departamento da Justiça de Bush, usou o absurdo depoimento de um cúmplice de Posada, o ex-oficial e torturador da polícia secreta venezuelana Joaquín Chaffardet, para decretar que o criminoso não podia ser deportado para a Venezuela.

Abbott informou então que concedia ao governo dos Estados Unidos "90 dias" para determinar o terceiro país que receberia o terrorista, prazo que depois foi ignorado.

O que parecia um trâmite relativamente fácil para um indivíduo que utilizou durante anos a América Central como base para os crimes que cometia por ordem da máfia de Miami, tornou-se algo difícil para os distintos enviados do Departamento de Estado de Bush.

No entanto, no caso de Honduras, os cabeças do poder imperial contaram, com certeza, com a subida ao poder do novo presidente para introduzir sub-repticiamente seu pedido.

Em 27 de agosto passado, em declarações aos jornalistas, após assistir a uma cerimônia oficial, o presidente Zelaya revelou a verdade sobre o insolente pedido dos EUA, "oito dias" depois de ele ter subido à presidência do país, em 27 de janeiro de 2006.

O embaixador dos Estados Unidos em Honduras, Charles "Charlie" Ford, foi quem fez as diligências para conseguir um visto para o terrorista, com a devida prepotência imperial.

"O embaixador Charles Ford veio pedir-me, através da Chancelaria, que desse um visto a Posada Carriles", denunciou o presidente referindo-se ao ex-chanceler Milton Jiménez Puerto.

"Era impossível dar um visto a Luis Posada Carriles, quando ele foi acusado de terrorista. Eles defendem esse tipo de terrorismo, tenho provas disso, e por coisas do gênero é que temos posições diferentes", sublinhou.

Posada Carriles tem um longo histórico de crimes cometidos na América Central, às ordens da CIA, desde sua fuga, em agosto de 1985, de uma prisão da Venezuela, onde permanecia preso pela sabotagem em 1976 de um avião civil cubano, matando 73 pessoas.

E do dia para a noite, converteu-se no braço direito de Félix "O Gato" Rodríguez em El Salvador, um dos mais fiéis canalhas da Companhia, o mesmo que ordenou em 1967, na Bolívia, o assassinato de Ernesto Che Guevara.

Até 5 de outubro de 1986, o terrorista dirigiu as manobras de uma frota de aviões na base aérea de Ilopango, que se dedicava ao tráfico de armas e drogas com os Contras nicaragüenses.

Quando do escândalo Irã-Contras, Posada foi o encarregado de recolher o material que comprometia a inteligência estadunidense e escondeu-se em Zabadú, um centro turístico salvadorenho, até que seus chefes em Langley lhe ordenaram ser colaborador da Polícia Nacional salvadorenha, com seu parceiro Hermes Rojas, outro ex-membro da Disip. Rojas era então chefe dos assessores venezuelanos dos órgãos de repressão do presidente José Napoleón Duarte.

Quem saiba a história de El Salvador nesse período, facilmente imagina ao que se dedicou durante anos o comissário Basilio da Disip venezuelana, que suas vítimas o descreveram como um torturador psicopata.

De El Salvador, Posada foi em 1989 para a Guatemala, onde ganhou uma nova identidade como chefe de segurança da companhia telefônica estatal Guatel. Em breve, o presidente Vinicio Cerezo lhe conferiu poderes especiais que o tornaram virtualmente um gângster. Nessa época, foram-lhe atribuídos execuções, seqüestros, vigarices e ajustes de contas.

Desde a década de 1990, Posada se envolveu numa cadeia de conspirações tanto na Guatemala, quanto em El Salvador e Honduras, onde as redes locais da extrema direita, ligadas a seus cúmplices do Comitê Paramilitar da Fundação Nacional Cubano-Americana, de Miami, solicitam seus serviços.

QUARENTA E UM ATENTADOS CONTRA O PRESIDENTE

Seus primeiros contatos com Honduras datam de 26 de fevereiro de 1990, quando foi atacado na rua por desconhecidos. Foi atingido por dois disparos, quando ia em sua Suzuki, de cor negra. Um deles lhe atingiu a mandíbula e cortou sua língua. Após sair do hospital, refugiou-se em território hondurenho, na casa de Rafael Hernández Nodarse, chefe local do aparelho terrorista anticubano da CIA.

Em 1992, quando investigadores do FBI dos EUA, que pretendiam indagar o caso de Ilopango para o Congresso, o localizaram nesse país, pediram-lhe uma entrevista. Nada mais nada menos que nas salas da embaixada dos EUA em Tegucigalpa e sem intenção nenhuma de prendê-lo.

Uns anos depois, Posada reconheceu numa entrevista com o The New York Times que um dos agentes, George Kyszinski, é um amigo pessoal.

Desde janeiro de 1994, Posada Carriles conspirou abertamente em ações dirigidas a desestabilizar o governo legítimo do presidente Carlos Roberto Reina.

No país onde Bush quis que se fixasse em 2006, Posada esteve envolvido em dois atentados contra o presidente, um financiado pela FNCA, que seria realizado em meio à tomada de posse de Reina, na presença do presidente cubano Fidel Castro.

Segundo o depoimento do presidente do Comitê Hondurenho de Direitos Humanos, doutor Ramón Custodio, Posada dirigiu até 1996 uma gangue de origem cubana, associada a militares hondurenhos que fizeram 41 atentandos no território nacional, sempre como o objetivo de derrubar o chefe de Estado.

Mais tarde, continuou utilizando a América Central para suas malfeitorias, inclusive, para lançar uma campanha de terrorismo contra Cuba em 1997, empregando mercenários centro-americanos, até sua detenção no Panamá, em 2000, quando tinha em vista fazer explodir um anfiteatro repleto de estudantes, onde iria falar o líder da Revolução cubana.

Indultado pela presidenta mafiosa, Mireya Moscoso, em agosto de 2004, Posada usou… Honduras como ponte para entrar ilegalmente no território de seus amos.

Enganou os serviços migratórios durante uma escala, usando um passaporte norte-americano falso a nome de Melvin C. Thompson e hospedou-se novamente em casa de seu cúmplice Hernández Nodarse. Depois se comentou que o FBI participou da manobra.

"HAVERÁ ALGUM HONDURENHO QUE NÃO SAIBA…?"

"Haverá algum hondurenho que não saiba que aqui, a embaixada (dos EUA) participou de golpes de Estado, promoveu na América Latina invasões e guerras noutros países?", perguntou-se Zelaya em sua intervenção.

"Por acaso não fomos vítimas da Guerra Fria na década de 1980, quando daqui era atacada a Nicarágua com a contra-revolução nicaragüense e Honduras era utilizada como território para ações bélicas?", lembrou.

O embaixador Charles Ford abandonou seu cargo em Honduras nos fins de julho passado. Voltou a seu país, tranqüilamente, depois de quase três anos de missão na legação dos EUA em Tegucigalpa.

Desde 2006, sete países americanos se recusaram a receber em seu território o terrorista: Canadá, México, Panamá, El Salvador, Honduras, Guatemala e Costa Rica. Todos eles foram vítimas, em muitas ocasiões, de ações terroristas organizadas em Miami pela CIA e por sua máfia de origem cubana.

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