Vira e mexe, a tentativa de extinguir artigos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) vem à baila. E mais uma vez estamos presenciamos isso nas discussões sobre a redefinição de alguns aspectos da organização sindical brasileira. É preciso resgatar algumas verdades sobre este importante instrumento de defesa dos direitos e garantias dos trabalhadores. A versão mais utilizada para atacá-la é a de que a instituição da CLT ocorreu num momento em que o autoritarismo dava as ordens no Brasil. É uma meia verdade.
Quando a CLT foi oficializada de fato, em 1941, o Brasil ainda vivia sob o domínio do Estado Novo. Mas a sua instituição foi guiada pela necessidade de se fazer um ordenamento sistemático das leis do trabalho já existente. Em uma entrevista recente, Arnaldo Sussekind, que participou da comissão responsável pela elaboração da CLT, disse que foram incorporados a legislação da véspera (a organização sindical, a Justiça do Trabalho) e os decretos legislativos (leis e decretos-leis).
Embate entre capital e trabalho
O espírito da CLT, portanto, nada tem de autoritário. Ele está em acordo com a perspectiva histórica de avanço das lutas sindicais, que já em 1941 apontava, na maioria dos países, uma evolução que trouxe a relação entre capital e trabalho, engrenagem básica da sociedade capitalista, para um patamar menos truculento. Na Inglaterra do início do século XIX, que emergia como a grande potência econômica do planeta, os trabalhadores — incluindo crianças — eram acorrentados às máquinas e trabalhavam 14, 16 horas por dia.
Embora de maneira não-linear e com muitos refluxos, chegamos ao século XXI com muitos avanços. E com o século XXI chegou o furacão neoliberal que começou a girar no final dos anos 70. Portanto, se a história ainda serve como guia a defesa da essência da CLT e dos seus aprimoramentos — destacadamente a Constituição de 1988 — é a principal bandeira que precisa ser fincada no campo de batalhas da luta trabalhista no Brasil de hoje.
É preciso perceber, evidentemente, que nem tudo nessa legislação é acerto. Mas é preciso perceber também que nem tudo é fracasso. O fundamental é entender que nossas leis trabalhistas são a síntese do embate entre capital e trabalho que atravessou todo o século XX e refletem nossas vitórias e derrotas. Até os anos 40, os trabalhadores empregaram lutas heróicas e, aos trancos e barrancos, foram arrancando conquistas aqui e acolá.
Tarefa de primeira importância
Pode-se afirmar que as refregas das três primeiras décadas daquele século representaram verdadeiras aulas de organização em sindicatos e federações, e inculcaram a primeira noção de força nos trabalhadores brasileiros. Grande parte dos artigos da CLT, portanto, devem ser avaliados como importantes conquistas que nunca foram aceitos pelo capital. Até hoje, os traços positivos e negativos da CLT — apesar das importantes correções feitas pela Constituição de 1988 — persistem e são reflexos das conquistas e das derrotas dos trabalhadores ao longo deste embate histórico.
O que desponta como tarefa de primeira importância, portanto, é a necessidade de afastar dos trabalhadores a idéia, difundida pelo patronato, de que a economia do Brasil não cresce mais por causa da regulamentação das relações de trabalho. Esse discurso interesseiro ganhou corpo com o aparecimento de várias propostas destinadas a “reformar”, com intensidades variadas, a CLT e a Constituição. Mas é um discurso capcioso, que deve ser combatido com determinação. E a Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB) tem a convicção que o conjunto do movimento sindical não medirá esforço nesta luta.
*Secretário-geral da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB).